Felix
Mendelssohn-Bartholdy – 1ª Parte[1]
Imaginemos que é o seu
casamento. Você entra toda feliz (ou deveria estar feliz!) na igreja. Inicia a
música, tocada em mais de 90% das cerimônias nupciais. Você, emocionada, ele,
pomposo, a te esperar. E a música continua a tocar. A música, por certo, é
apenas um detalhe em seu casamento (e que detalhe). Agora, também é certo que
muitos de nós desconhecemos o compositor desta marcha, sabendo, muitas vezes,
que se trata apenas de uma “marcha nupcial”.
Nesse texto você começará
a conhecer quem é o compositor de uma das melodias mais tocadas em todo o
mundo, e que simboliza de maneira marcante as cerimônias nupciais. Terá a
oportunidade de conhecer outros trabalhos desse talentoso homem do século XIX.
Vamos começar.
Jakob Ludwig Felix
Mendelssohn-Bartholdy é o nome do autor da “Marcha Nupcial”. Nascido no dia 3
de fevereiro de 1809 em Hamburgo, Mendelssohn foi um dos maiores compositores
do século XIX. Veremos que o trabalho desse célebre compositor foi além do
campo musical. Conheceremos primeiramente a cidade de Hamburgo no período (bem
como a região onde se localizava), buscando entender um pouco melhor a vida de
Mendelssohn.
Hamburgo, à época do
nascimento de Mendelssohn, já era uma grande cidade industrial da Prússia. A
região, desde o final da chamada Baixa Idade Média apresentava uma intensa e
rica atividade comercial (sendo Hamburgo uma das principais cidades da Liga
Hanseática). No século XVIII Hamburgo (assim como outras regiões do Sacro
Império Romano Germânico) viveu o fortalecimento do Reino da Prússia, sendo que
este emergiu “como unidade econômica e política de grande dinamismo, criando
crescentes tensões entre os Estados alemães”[2].
Na passagem do século XVIII para o século XIX, a região passou por situações
diversas: dos triunfos napoleônicos sobre a Prússia, em 1806 - e anexação da
cidade de Hamburgo pelas tropas napoleônicas, entre 1810 e 1814 -, à formação
da Confederação do Reno, o que acabaram por determinar o fim do sistema
multipolar que existia no Sacro Império Romano-Germânico.
“Na Europa Central do
século XVIII, a cultura foi uma via de escape para as energias intelectuais que
não podiam voltar-se para a o política, dominada pela autocracia dos príncipes.
Esse é o contexto do idealismo e do espiritualismo que caracterizaram a arte e
literatura alemães, expressas por filósofos como Kant e Herder, e escritores
como Goethe (uma das figuras centrais na
vida de Mendelssohn) e Schiller.”[3]
Em 1815[4],
Napoleão foi derrubado, o que iria representar um novo ciclo de mudanças na
região onde Mendelssohn nasceu. Foi criada, através dos príncipes alemães, uma
confederação de 39 Estados independentes, “exceto no campo da política exterior”
[5].
Foram justamente as diferenças e oposições das monarquias da Prússia e da
Áustria pela adoção de formas mais amplas de representatividade política que
levaram a ocorrência das rebeliões da década de 30 do século XIX. Movimento que
contou com a participação popular, fora violentamente reprimido pelas referidas
monarquias.
“Em 1834, a Prússia deu
forma política a seu crescente peso econômico ao instaurar a União Aduaneira
Alemã, da qual a Áustria ficou excluída. Teve como efeito a duplicação do
comércio entre seus membros em um prazo de dez anos e a formação de alguns
centros industriais, de onde surgiu uma classe operária. Devido ao rápido crescimento
da população urbana (o que ocorreu
claramente em Hamburgo na segunda metade do século XIX. A população quase que
quadruplicou, chegando aos 800 mil habitantes. Seu porto se tornou um dos três
mais importantes do continente europeu), a oferta de mão-de-obra superou amplamente a demanda. O consequente
empobrecimento dos trabalhadores fabris e dos artesãos serviu de caldo de
cultivo para as rebeliões dos anos posteriores, cujo ponto culminante foi a
onda revolucionária de 1848-1849”[6].
Hamburgo, nessa primeira
metade do século XIX ficou, portanto, marcada pela ascensão prussiana, a
invasão napoleônica, a formação de uma confederação de Estados Independentes
alemães, uma série de revoltas, interpoladas pelo embate entre a unificação e a
manutenção, sob certa perspectiva, do status
quo. De um lado, um movimento liberal e democrata (forte, porém não tão
coeso), que lutava por um processo de unificação, mas com a garantia da
manutenção das liberdades políticas, muitas delas conquistadas no processo de
formação da Liga Hanseática; de outro, um intenso esforço das monarquias em
manter as estruturas de um antigo regime. Não é o propósito de nosso texto
fazer uma análise muito extensa sobre o processo de unificação da Alemanha,
porém segue um breve resumo.
Tal situação se arrastou
até a segunda metade do século XIX, culminando na unificação de 1871, através
da figura de Otto Von Bismarck, do domínio prussiano e do poder monárquico.
Hamburgo no século XIX[7]
A vida de Mendelssohn, a princípio, não parece estar envolvida nessa sequencia turbulenta de eventos. Ao contrário, poderíamos ponderar que o jovem de Hamburgo teve uma vida relativamente clama, marcada por um cosmopolitismo que contrastava com o crescente nacionalismo presente na região.
Mendelssohn[8]
Mendelssohn nasceu nessa
Hamburgo, no seio de uma família judia com notável condição econômica (o pai, Abraham
Mendelssohn, era um importante banqueiro, o que permitiu ao futuro compositor
desfrutar de uma vida marcada por inúmeras possibilidades). Viajando por
diversas regiões da Europa, tendo contato com diversos centros culturais e
intelectuais, Mendelssohn pôde se dedicar às artes. E também há que se pontuar
que houve notável influência da família para que o jovem seguisse a carreira. Lea
Salomon, mãe de Mendelssohn, foi determinante na escolha de seu filho pela
carreira musical. Tendo como tia Sara Levy, uma das melhores alunas de Bach,
Lea também influiu na escolha de seus outros filhos pela música, principalmente
a menina Fanny, mais velha que Felix.
Sendo assim, Mendelssohn,
bem como a sua irmã, mais velha, Fanny, foram endereçados para o campo musical
desde muito cedo. Prova disso é o fato de Fanny ter começado a compor muito
jovem ainda. Já Mendelssohn, aos sete anos, apresentava progressos tão
significativos que fizeram o pai decidir se mudar para Paris, “onde poderiam
desenvolver uma carreira musical que não seria possível em casa. Marie Bigot,
uma das intérpretes preferidas de Beethoven, foi escolhida como professora para
essa tarefa e cumpriu-a à risca.”[9]
O seio da família
Mendelssohn ficou marcado pela presença de grandes intelectuais da época.
Desfilaram pela família Mendelssohn personalidades como Wilhelm von Humboldt
(1767 - 1835), Alexander von Humboldt (1769 – 1859), Johann Wolfgang von Goethe (1749 – 1832) além de outros tantos. O avô de Felix
foi o filósofo e rabino judeu-alemão Moses Mendelssohn (1729-1786)[10].
Para Abraham, “para ser um bom músico, era
preciso ser intelectualmente desenvolvido” [11],
o que o fez estimular o filho a estudar diversas línguas e culturas.
“Proporcionou-lhe também aulas de pintura (...) – uma arte em que tanto Felix
quanto a irmã já se destacavam. Existem provas notáveis disso nos muitos
desenhos e aquarelas realizados ao longo de suas numerosas viagens” [12].
No entanto, foi na música que Mendelssohn demandou mais tempo, se dedicou de
forma mais intensa. A irmã também tinha dons significativos, sendo uma
excelente pianista. O fato da mesma não alcançar o sucesso do irmão se deve a
questão da mesma viver em uma sociedade marcada por preconceitos de diversas
ordens. Mendelssohn levou pouco tempo para se destacar, sendo que no dia 28 de
outubro de 1818, aos nove anos de idade, promoveu seu primeiro concerto ao
piano.
A educação de Mendelssohn
foi permeada por figuras históricas de grande relevância, como vimos, o que
facilitou a divulgação de seu nome. No entanto, Abraham sabia que um fator
poderia prejudicar de maneira significativa a carreira de seu filho. Abraham,
em 1812, abriu mão da religião judaica (resultado de outro preconceito da época,
já presente na Idade Média e que encontraria terrível campo no século vindouro),
decidindo que a família toda deveria ser batizada na Igreja Luterana. Para
disfarçar as raízes judaicas, acrescentou o sobrenome Bartholdy depois de
Mendelssohn. Posto isso, podemos afirmar que a família Mendelssohn vivia de
maneira direta os acontecimentos desencadeados na região. Em nosso próximo
texto entraremos em contato com alguns dos trabalhos de Felix
Mendelssohn-Bartholdy. Até lá!
[1] RAMOS, Pedro Henrique Maloso
[2] Enciclopédia do mundo contemporâneo/
[tradução de Jones de Freitas, Japiassu Brício, Renato Aguiar] – São Paulo:
Publifolha; Rio de Janeiro: Editora Terceiro Milênio, 2000. p. 95.
[3] Enciclopédia do mundo contemporâneo/
[tradução de Jones de Freitas, Japiassu Brício, Renato Aguiar] – São Paulo:
Publifolha; Rio de Janeiro: Editora Terceiro Milênio, 2000. p. 95.
[4] 1815 foi o ano da derrota de
Napoleão Bonaparte na Batalha de Waterloo, na Rússia.
[5] Enciclopédia do mundo
comteporâneo/ [tradução de Jones de Freitas, Japiassu Brício, Renato Aguiar] –
São Paulo: Publifolha; Rio de Janeiro: Editora Terceiro Milênio, 2000. p. 95.
[6] Enciclopédia do mundo
comteporâneo/ [tradução de Jones de Freitas, Japiassu Brício, Renato Aguiar] –
São Paulo: Publifolha; Rio de Janeiro: Editora Terceiro Milênio, 2000. p. 95.
[7] Imagem extraída do sítio http://www.skyscrapercity.com/showthread.php?t=196145
[8] Imagem extraída do sítio http://www.bach-cantatas.com/Lib/Mendelssohn-Felix.htm
[9] Felix Mendelssohn: Royal
Philharmonic Orchestra/ [Mediasata Group S.A.; texto e documentação musical
Eduardo Rincón; tradução: Linguagest]. – São Paulo: Pubifolha, 2005 – (Coleção
Folha de Música Clássica). p. 10.
[10] Moses foi um dos precursores do
Haskalá “(Iluminismo judaico), movimento político que
prega uma atitude mais aberta para os valores seculares e o modo de vida dos
não-judeus. As idéias da Haskalá incentivam a emancipação da juventude, que
procura distanciar-se do judaísmo ortodoxo e das ieshivot.” – in http://www.morasha.com.br/conteudo/artigos/artigos_view.asp?a=277&p=0
[11] Félix Mendelssohn: Royal
Philharmonic Orchestra/ [Mediasata Group S.A.; texto e documentação musical
Eduardo Rincón; tradução: Linguagest]. – São Paulo: Pubifolha, 2005 – (Coleção
Folha de Música Clássica). p. 10.
[12] Félix Mendelssohn: Royal
Philharmonic Orchestra/ [Mediasata Group S.A.; texto e documentação musical
Eduardo Rincón; tradução: Linguagest]. – São Paulo: Pubifolha, 2005 – (Coleção
Folha de Música Clássica). p. 10.
Nenhum comentário:
Postar um comentário