quinta-feira, 19 de novembro de 2020

Texto-base: o Império Romano

 O Império Romano[i]

A escolha da frase que abre esse texto não é de forma alguma aleatória. Ainda que a mesma faça referência ao período republicano (início do século I a.C.), as consequências para o período imperial foram sérias. O próprio professor Leoni discorre que a Roma gloriosa desmoronou com o 2º Triunvirato. Mas, antes de listarmos os mais diversos problemas, vamos compreender os primórdios da vida imperial romana.

O início do império romano

O primeiro imperador romano, Otávio Augusto, foi habilidoso para restituir a paz em Roma, tanto interna quanto externamente.  “Augusto domina totalmente, dá a Roma mais esplendor civil e político, consolida o império”[ii].

Mas, após Otávio, a situação desandou de forma impressionante. Em grande parte pelo fato de que os imperadores que sucederam Otávio Augusto, após a sua morte, em 14 d.C., fizeram coisas que, convenhamos, os colocam como os piores administradores da História. Tibério (14 – 37)[iii], imagem ao lado, sucessor de Otávio, deu início a uma época de terror, marcada por espionagens e delações. Resultado: foi assassinado. O próximo imperador foi Calígula (37 – 41), um das figuras mais desequilibradas da História. Desde a nomeação de seu cavalo, Incitatus, como cônsul, até o fato de que promovia rotineiras festas, movidas à sexo, Calígula prostituiu as esposas dos senadores. Resultado: foi assassinado.

Você acha que acabou? Não! Apesar da existência de Cláudio (41 – 54), com um governo que adotou medidas que buscaram retomar uma política mais equilibrada em Roma, seu sucessor, Nero (54 – 68), governou de maneira desastrosa.

Nero, sobrinho de Cláudio, apesar de estar sob os cuidados de uma das mentes mais brilhantes da História, Lúcio Annêo Sêneca (4 a.C. – 65), o que conferiu ao início do seu governo um período de grandiosidade, ficou conhecido por mandar matar cristãos, incendiando bairros romanos onde esses viviam. bem como mandar assassinar a sua mãe, Sêneca se suicidar...

Tragicômica, a sua morte é um dos eventos que mostra o quão Nero era destemperado. Ao ver as tropas de Sérvio Sulpício Galba (68 – 69) se aproximarem para retirá-lo do poder, Nero se mata, soltando a frase: “que artista o mundo perderá!”. Isso porque o sobrinho de Cláudio considerava-se um excelente cantor. Cada uma...

Depois disso, dessa hecatombe de tragédias, fica óbvio entender o porquê os historiadores consideram que, após a morte de Otávio Augusto, Roma ficou marcada por inúmeros e graves problemas. Além disso, a expansão territorial, realizada pelos romanos, continuou, porém diminuiu, e a maior preocupação agora era manter as áreas conquistadas. Assim, a política romana não privilegiava mais as áreas a serem conquistadas e sim a proteção das áreas que foram conquistadas.

Com isso, os romanos buscaram melhorar as províncias (as regiões conquistadas), sendo comum a presença de províncias ricas. No período também se consolidou a economia romana baseada na escravidão, onde o escravo estava inserido em todas (ou quase todas) as relações de trabalho na Roma Antiga, o que conferiu a essa sociedade o título de sociedade escravista. No entanto, os escravos vinham das conquistas romanas. Como os imperadores diminuíram as conquistas houve, consequentemente, uma diminuição na oferta de escravos o que fez surgir um problema: como uma sociedade escravista vive sem escravos? Isso começou a enfraquecer o império.

Justamente para “contornar” o problema da falta de escravos, outras conquistas foram feitas até que, após 117 d.C., elas definitivamente acabaram. Nessa época o Império chegou a sua maior extensão, uma área realmente impressionante. Os romanos conquistaram regiões em três continentes: Europa, África e Ásia. Foi no governo de Trajano, entre 98 d.C. e 117 d.C. que o império atingiu sua maior área.


Frente ao exposto, já a partir do século II, em 138, após a morte do imperador Adriano, Roma mergulhou em crises, decadências, começando a perder a sua unidade, resultado também da penetração dos povos que moravam nas redondezas do Império Romano.

A formação da crise imperial

A dependência da economia romana quanto ao trabalho escravo fez surgir um grave problema: uma sociedade escravista que não possuía a oferta de escravos, fazendo com que o preço dos escravos que existiam aumentasse muito! Os escravos produziam os alimentos e como o seu preço estava subindo, o preço dos alimentos subia também!

Assim, alimentos mais caros impediam que a população pobre se alimentasse adequadamente. Era a formação de um problema sem aparente solução! E como se não bastassem essas situações, o século III d.C. (201 – 300) foi marcado por outros problemas sociais graves, como o inchaço do exército. Vamos explicar.

Como o império aumentou era necessário cada vez mais soldados para proteger as fronteiras. Um número maior de soldados significava um aumento nos gastos (manter um exército é caro!). Assim, mais dinheiro era gasto. Para piorar a situação existia uma enorme instabilidade política, com disputas de poder e problemas internos. Era necessário buscar soluções.

Além do mais

O texto que você acabou de ler deixou bem claro que Roma estava cheia de problemas! Faltava comida, emprego, moradia... Assim, os plebeus estavam ficando revoltados.

Diante disso, os imperadores passaram a utilizar a tática do chamado “Pão e Circo”. O que seria?

No Coliseu, quase todos os dias, gladiadores lutavam até a morte, divertindo a população. Um espetáculo circense aterrador! Havia leões, tigres, homens se enfrentando. E, durante as lutas, refeições eram servidas. A ideia era que, de estômago cheio e com outras coisas para pensar, os revoltosos se acalmariam, esqueceriam os problemas.




[i] Pedro Henrique Maloso Ramos

[ii] Leoni, G. D. “A Literatura de Roma” – 6ª ed. – São Paulo: Livraria Nobel S. A., 1961. p. 76

[iii] ATENÇÃO: os períodos registrados fazem menção ao governo, e não à vida dos imperadores aqui citados.

 

2º texto-base: a expedição de Martim Afonso de Sousa e as bases econômicas da colonização

 2º Texto-base: a expedição de Martim Afonso de Sousa e as bases econômicas da colonização[i]

A expedição que viria colonizar o Brasil foi organizada sob e com a interferência do rei português D. João III, que passou a ser conhecido como O Colonizador, buscando, portanto, ocupar as terras oficialmente. Foi comandada por Martim Afonso de Sousa e contava com cinco embarcações – um galeão, duas caravelas e duas naus – e mais de 400 pessoas à bordo.

Durante a viagem ao Brasil, os portugueses combateram e capturaram alguns navios franceses em águas brasileiras, bem como exploraram o rio da Prata, no sul do continente americano. Sabemos que a exploração desse rio foi um dos principais motivos da viagem de Martim Afonso de Sousa, já que se acreditava ser o Prata um dos caminhos para as regiões ricas em metais preciosos da América andina. Cerca de um ano depois de sua partida de Portugal, Martim Afonso de Sousa fundou, em janeiro de 1532, a vila de São Vicente, o primeiro núcleo efetivo dos portugueses no Brasil.

Martim Afonso chegou à colônia com poderes judiciais sobre os demais homens que auxiliariam na colonização, bem como sobre os nativos e portugueses que habitavam o Brasil. Também ficou sob sua responsabilidade a missão de criar cargos judiciários e administrativos, necessários para o processo de colonização, e iniciar a distribuição de terras entre os colonizadores.

Ao redor da vila fundada por Martim Afonso de Sousa foram se organizando os primeiros engenhos de açúcar – base econômica do início da colonização. É importante enfatizarmos que os engenhos portugueses foram em grande parte construídos graças  ao capital holandês. A cana-de-açúcar também foi introduzida no Brasil por Martim Afonso de Sousa, dono do primeiro engenho erguido na colônia, e auxiliado pelo capital do holandês Johann van Hielst – conhecido pelos portugueses como João Vaniste.

Há uma explicação para a interferência e participação dos holandeses, principalmente no início da colonização. Portugal enfrentou significativos problemas ao iniciar a colonização, sendo que um dos maiores remetia à falta de capital (dinheiro) para colocar em prática o projeto colonizador. É nesse ponto que temos a participação dos holandeses, em sua maioria banqueiros e mercadores que, havia tempos, estavam associados com os portugueses, e passaram a financiar as construções dos engenhos e de outras inúmeras atividades econômicas da colônia.

Representação de um engenho de açúcar do período colonial. Dê uma olhada na evidente relação com o trabalho escravo.

Vários fatores justificam a escolha da cana-de-açúcar como mercadoria a ser produzida na colônia. Portugal já havia iniciado a produção de açúcar, através do cultivo da cana-de-açúcar, antes do descobrimento do Brasil. O açúcar português era produzido nas ilhas de Madeira, Açores e Cabo  Verde.

Portanto, não se tratava de uma atividade agrícola e comercial desconhecida. Atrelado a isso está o fato de que o açúcar se tratava de  uma especiaria, “dono” de um mercado em expansão na Europa. Mas um dos fatores mais determinantes foi a semelhança entre os climas e condições ecológicas das ilhas atlânticas e do Brasil, principalmente do nordeste brasileiro, muito favoráveis ao plantio de cana-de-açúcar.

A fundação dos engenhos de açúcar tinha como objetivo povoar a colônia e assegurar a posse para os portugueses. Os engenhos se encaixavam no sistema econômico das plantations, ou seja, extensas plantações de um determinado gênero agrícola – no caso, a cana-de-açúcar –, produzindo mercadorias que fossem exportadas para o mercado europeu. Em decorrência desse sistema, as plantations[ii] faziam com que em todas áreas onde fossem implantadas, a policultura se tornasse atividade de caráter secundário e extremamente restrito.

A pecuária nordestina foi importante como atividade secundária. De grande importância na produção e manutenção do sistema açucareiro, na medida em que o gado criado em áreas próximas às plantações de cana-de-açúcar e aos engenhos era utilizado como força motriz para movimentar as moendas, meio de transporte para levar cargas e trabalhadores, vestuário – com a utilização do couro do animal – e fonte de alimento. A interiorização da pecuária se tornou um processo de singular importância na ocupação de novas terras pelos portugueses, como veremos.

Podemos resumir o sistema de plantations da seguinte maneira: uma grande propriedade agrícola, trabalhada em sua imensa maioria por escravos, com tendência a autossuficiência, cuja produção se voltava quase que exclusivamente para o mercado externo.

As capitanias hereditárias

Para efetivamente colonizar a grande extensão colonial, a monarquia portuguesa escolheu o sistema de Capitanias Hereditárias, que já havia sido utilizado, com relativo sucesso, em algumas outras áreas coloniais de Portugal. A chegada de Martim Afonso de Sousa oficializou o início da montagem do sistema colonial, fazendo com que as terras fossem divididas em 15 lotes, doados a 12 capitães donatários (portanto, houve casos de donatários que receberam mais do que um lote). Esses capitães assumiriam a responsabilidade – quase que em todas as esferas – de fazer com que a colonização de seus lotes ocorresse e que esses se tornassem rentáveis do ponto de vista mercantil. Os cargos de donatários eram vitalícios e hereditários. Voltaremos a falar dos capitães donatários.

O processo de ocupação de um lote era, de fato, oneroso e complicado. Buscando “convencer” os donatários a assumirem suas Capitanias, a Coroa Portuguesa criou uma série de vantagens, dentre as quais o fato dos donatários terem o direito de escravizar as populações indígenas, desde que enviassem à Coroa Portuguesa uma parte da renda conseguida nesse comércio, bem como alguns escravos indígenas. Os donatários poderiam doar sesmarias - lotes de terras - a quem se interessasse em cultivá-los. No entanto, a doação só poderia ser feita aos cristãos portugueses. A distribuição de terras ficava sob a responsabilidade do donatário, o que não quer dizer que o mesmo fosse proprietário das terras. Todas as terras das Capitanias Hereditárias pertenciam ao rei português. Os donatários atuariam como administradores das terras reais.

A princípio, a Coroa Portuguesa havia “convidado” membros da alta nobreza para se tornarem donatários na nova missão colonizadora em que Portugal embarcara. O desinteresse foi tanto, que a Coroa Portuguesa fez dos militares e navegadores ligados ao comércio oriental alguns dos seus capitães donatários. O maior ônus para os capitães donatários estava no fato de que grande parte da colonização se daria por investimentos próprios, e a grande maioria desses homens não possuía capital suficiente para tocar um projeto de tal envergadura.

Muitos donatários – inclusive o donatário Martim Afonso de Sousa -, no intuito de iniciar a colonização de seus lotes, buscaram fazer empréstimos de banqueiros e negociantes – principalmente judeus - de Portugal e da Holanda. Mesmo assim, uma significativa parcela desses homens nunca chegou a pisar na colônia. Um dos maiores receios estava no fato de que o dinheiro aplicado nos lotes não gerasse o devido retorno. E dos que chegaram a iniciar a colonização dos lotes recebidos, poucos foram os que obtiveram sucesso. O fracasso vinha por diversos motivos: terras inóspitas, índios hostis, distância entre as capitanias, dificuldade em defender as vilas etc.



[i] Pedro Henrique Maloso Ramos

[ii] fica clara a intensa relação entre relação cultivo da cana, o engenho e a plantation, bases do processo colonizador português

1º Texto-base: o período pré-colonial (1500 - 1532)

1º Texto-base: o período pré-colonial (1500 - 1532)[i]


O início das relações entre Portugal e as terras que este havia “descoberto”, através da expedição de Pedro Álvares Cabral, não indicava um futuro muito promissor, já que não foram encontrados metais preciosos  em quantidade significativa. Além disso, à primeira vista, as terras americanas não apresentavam nenhuma especiaria que pudesse ser  efetivamente comercializada, o que gerava o seguinte problema: o quê fazer com as novas terras? Daí, o pouco interesse em explorar a nova colônia, terras que, a princípio, interessavam muito menos do que a rota das especiarias e o comércio oriental. Era necessário encontrar algo que pudesse ser comercializado, ao contrário do Oriente, onde já existia um rico mercado de especiarias montado.

O  navegador  florentino Américo Vespúcio (1454  -  1521), que navegou tanto para espanhóis quanto para portugueses, e que havia alertado para a inexistência de algo proveitoso nas terras brasileiras, fez questão de afirmar a existência de uma grande quantidade de uma árvore específica: o pau-brasil. Conhecida pelos europeus desde os tempos medievais, a planta era encontrada nas ilhas do sudeste asiático – a árvore encontrada no Brasil é, portanto, um “parente” muito próximo da espécie indiana – e com as mesmas qualidades. Tal árvore é capaz de tingir linhos, sedas e algodões de vermelho. Tratava-se, portanto, de uma especiaria.

Funcionando dentro da lógica mercantil, a exploração do pau-brasil na costa brasileira foi feita através do monopólio real. A Coroa arrendou a exploração do pau-brasil no território brasileiro aos cristãos-novos (judeus  convertidos ao cristianismo), que deveriam pagar uma taxa anual e levar, no mínimo, seis embarcações por ano para a metrópole, cheias de pau-brasil.

O primeiro cristão-novo a fechar um contrato com a Coroa portuguesa foi Fernão de Noronha (1470 - 1540). Isso ocorreu em 1502, sendo que Fernão arrendou a exploração de pau-brasil por três anos, à frente de um consórcio de judeus conversos. O acordo foi renovado três vezes, sendo que depois de 1513, a extração do pau-brasil foi liberada, desde que os exploradores pagassem o quinto – 20% daquilo que foi explorado – à Coroa portuguesa.

O pau-brasil era extraído de que maneira?

Através de feitorias estabelecidas na costa, os portugueses contavam com a ajuda do trabalho indígena, por meio do escambo, para extrair as toras de madeira da mata. Em linhas gerais, o escambo era feito pelas trocas realizadas entre índios e portugueses. Os primeiros derrubavam e transportavam as toras de madeira até o litoral em troca de pequenos objetos úteis ofertados pelos portugueses, como espelhos, pentes, anzóis e facões. Terminada a exploração de uma dada área, os portugueses abandonavam aquela feitoria e mudavam-se para uma outra região rica em pau-brasil. Portanto, podemos afirmar que se tratou de uma atividade apenas exploratória, de caráter rudimentar e nômade, não contribuindo para a formação de nenhum povoado nas primeiras três décadas de exploração do pau-brasil. Assim, nenhuma vila surgiu até 1532. Os primeiros portugueses que ficaram na colônia não podem ser entendidos como colonizadores, na medida em que estavam em número reduzido e, muitas vezes, viviam com usos e costumes das populações indígenas - o que, de fato, não era o objetivo da Coroa portuguesa e muito menos caracterizava um projeto colonizador. No entanto, esses homens teriam significativa importância quando se iniciou o processo de colonização, já que conheciam a língua indígena e passariam a atuar como intérpretes. Até 1530 não houve a implantação de nenhum corpo legislativo – regulamentação documentada - para a nova terra, sendo que os capitães de navios e os líderes das expedições exerciam as prerrogativas de juízes.

Entre 1500 e 1530, Portugal já enfrentava um grave problema com as frequentes invasões na nova colônia, principalmente dos franceses. Muitos desses invasores vinham ao litoral da colônia portuguesa para contrabandear o pau-brasil. Os franceses possuíam boas relações com algumas tribos indígenas brasileiras – em especial os tupinambás, que se tornaram seus aliados -, o que preocupava a Coroa portuguesa, já que isso facilitava o contrabando da madeira. Visando combater tal problema, a Coroa portuguesa enviou duas expedições guarda - costeiras ao Brasil, o que de modo algum resolveu a questão das invasões.

No entanto, um problema maior do que esse se colocava para Portugal. França e Inglaterra não aceitavam a partilha do Novo Mundo entre espanhóis e portugueses. Os franceses também levantaram uma importante questão, retomando o conceito de propriedade das terras a partir do Uti Possidetis. Essa clausula colocava que a terra só pertenceria efetivamente aquele que a ocupasse. O simples envio  de expedições para resguardar a costa de nada valia. A única solução que se apresentou a Portugal foi a de colonizar a nova terra.

A necessidade de colonizar o Brasil e o temor de perder essas terras veio com a descoberta pelos espanhóis de jazidas auríferas e de prata na região do atual México, tornando as terras do Novo Mundo extremamente atrativas. Além disso, a perda também do monopólio sobre a rota das especiarias orientais, através do surgimento da concorrência espanhola, fez com que Portugal tivesse que buscar outro mercado rentável. Assim, com a queda do grande centro econômico português – o comércio oriental –, a colonização do Brasil se fez necessária, na medida em que ela poderia auxiliar no renascimento mercantil lusitano.

Para os portugueses, o Brasil começou na vila de São Vicente, fundada em 1532. Hoje São Vicente é um dos municípios que compõem a Baixada Santista. Ao lado, uma foto de São Vicente atualmente!

Além do mais...

Com a entrada da Espanha na expansão ultramarina – bem como no ciclo das grandes navegações –, tivemos o início de uma polêmica entre os espanhóis e os portugueses pela posse das terras recém descobertas da América. Em 1492, através de Cristóvão Colombo, os espanhóis chegavam ao continente americano. O próprio Colombo acreditava ter chegado na parte leste do Oriente – o que, sabemos, é um equívoco –, e a partir das coordenadas cartográficas passadas por esse, o rei português disse já saber da existência daquelas terras e que, portanto, seriam de Portugal.

Frente ao imbróglio que se criou, os espanhóis recorreram ao papa, autoridade maior quando se tratava de assuntos relacionados as terras que não pertenciam a nenhum reino cristão. A ocasião era extremamente favorável para os espanhóis, já que o então papa Alexandre VI era espanhol e mantinha estreitas relações com a coroa espanhola. O resultado da intervenção papal foi inteiramente favorável aos espanhóis. Em 1493, o papa Alexandre VI publica a Bula Intercoetera, determinando os domínios portugueses e espanhóis. Seriam da Espanha as terras que estivessem a oeste da linha imaginária traçada verticalmente, a 100 léguas a oeste das Ilhas de Cabo Verde. As terras a leste pertenceriam a Portugal.

Essa divisão do mundo dava aos espanhóis todas as novas terras descobertas.

Como já era previsível, Portugal não aceitou tal partilha e chegou a ameaçar entrar em conflito com os espanhóis. Estes, percebendo a iminência de uma guerra, buscaram solucionar o problema, agora sem a interferência do papa, e sim diretamente com os portugueses. Nesse intuito foi criada uma nova divisão do mundo, em 1494: o Tratado de Tordesilhas. Dessa vez o meridiano passava a 370 léguas à oeste das ilhas de Cabo Verde. As terras a leste do meridiano pertenceriam a Portugal, e as terras a oeste pertenceriam aos espanhóis.

Com esse novo Tratado, a rota para as Índias estava assegurada para Portugal, ou seja, o continente africano. Além disso, estava garantida a posse de uma parte das terras descobertas. No Brasil, a linha do Tratado se estendia do que hoje são as cidades de Belém (PA) até Laguna (SC).



[i] Pedro Henrique Maloso Ramos


quinta-feira, 5 de novembro de 2020

Texto-base para a SD dos sextos Anos

 Mergulhando na República Romana[i]

Roma agiganta-se durante o período republicano. E isso ocorre das mais diversas formas. Nos próximos parágrafos você entenderá os porquês do período republicano ser entendido como um momento grandioso para a Roma Antiga.

A expansão romana

Consideramos o período republicano como a fase em que a civilização romana está se expandindo, muito além do que fora feito pelos etruscos durante a Monarquia. E essa expansão republicana marcou definitivamente a história da civilização romana.

Vimos que Roma nasceu em meio a outras civilizações, o que a fez adotar, desde o inicio, uma postura defensiva. Não foi à toa que Sérvio Túlio ergueu os muros ao redor da cidade. No entanto, por volta de 275 a.C., os romanos já haviam conquistado todas as regiões da península itálica, passando agora para um desafio bem maior: conquistar as regiões ao redor do mar Mediterrâneo.

Dessa forma, Roma passou a desafiar os cartagineses, uma ex-colônia fenícia, localizada no norte da África. Ficou claro que conquistar Cartago significava, simplesmente, conquistar o Mediterrâneo ocidental e, portanto, garantir o controle de todo o comércio da região. Essa conquista ocorreu após o fim da 2ª Guerra Púnica, em 201 a. C.

Mesmo sem ainda conquistar a cidade de Cartago (o que ocorreria na 3ª Guerra Púnica), os romanos passaram a ter como objetivo tomar a Grécia Antiga, que estava profundamente enfraquecida após a morte de Alexandre, o Grande. E assim foi feito. Em "pouco mais de cinquenta anos, Roma conseguira transformar o Mediterrâneo inteiro em mar romano e todo o mundo grego cairá ante as legiões de Roma"[ii].

Óbvio que esse contato com os gregos fez com que a cultura helenística penetrasse diretamente na sociedade romana. É nesse momento que a cultura grega renasce dentro da sociedade romana.

Portanto, retomando, os conflitos entre romanos e cartagineses ficaram conhecidos como guerras púnicas.  Conjuntamente a esses conflitos veio o domínio de Roma sobre a Grécia. Resultado: o mar Mediterrâneo passou a ser chamado pelos romanos de mare nostrum, nada mais que “nosso mar”.

Além do que já apontamos neste e em textos passados, o período republicano trouxe as seguintes mudanças:

a) Roma se tornou uma civilização escravista, ou seja, vivendo em grande parte do trabalho escravo. Os escravos romanos eram povos conquistados.

b) a civilização romana se tornou mais rica e complexa, com o surgimento de outras classes sociais, ligadas principalmente aos patrícios, como foi o caso dos Clientes, pessoas que eram dependentes dos aristocratas.

c) começou a ocorrer o fenômeno do êxodo rural, ou seja, a saída dos pequenos camponeses do campo para a cidade, principalmente para Roma, devido em grande parte ao controle cada vez maior das terras pelos patrícios e também pela enorme vocação comercial que Roma passou a ter.

Pirâmide social do período republicano.

Atente para o fato de que o ponto c revela-se um problema. Um grave problema, sendo um dos maiores responsáveis pelo início da crise romana. A cidade de Roma não conseguiu suportar um número tão grande de novos moradores. E há que se registrar que os novos grupos sociais passaram a exigir participação política. Era o início da crise republicana, assunto que veremos agora.

A crise republicana

As mudanças do período republicano provocaram uma situação ambígua em Roma. Por um lado, os romanos haviam conquistado todo o mar Mediterrâneo, tornando a civilização extremamente forte e o território bastante extenso. Por outro, os plebeus passavam cada vez mais por dificuldades.

Dois tribunos da plebe, Tibério Graco e Caio Graco (entre 133 e 123 a.C.), foram responsáveis por levar propostas de leis a favor da plebe para a discussão no senado, propondo inclusive uma “reforma agrária”. Os patrícios, que lideravam o Senado, não concordaram, assassinando Tibério em uma discussão. Seu irmão, Caio, tentou implantar as reformas, porém não obteve grandes sucessos. Em um conflito armado com a aristocracia, Caio pediu a um escravo que o matasse.

O conflito estava bem determinado: de um lado, os patrícios querendo manter seus privilégios. De outro, os plebeus lutando por medidas que permitissem um maior acesso as terras e as riquezas de Roma. Foram essas disputas entre "os cidadãos romanos" pelo controle do poder político que aumentaram cada vez mais a instabilidade da sociedade, marca do final da República romana.

Nesse clima, o Senado, em 60 a.C., elegeu três grandes líderes políticos ao consulado: Júlio César, Pompeu e Crasso. Juntos, eles formaram o chamado 1º Triunvirato, e dividiram entre si o poder e os domínios romanos.   

Contudo, Crasso morreu na Pérsia (54 a.C.), e Pompeu tornou-se cônsul único, recebendo a tarefa de combater César e destituí-lo do comando militar da Gália. Ao saber das notícias, César resolveu lutar e dirigiu-se para Roma. Nesse momento, César assumia o poder romano, derrotando definitivamente Pompeu no ano de 49 a.C.

O domínio de César foi cada vez maior. Controlando diversas regiões e conflitos, César chegou a Roma, após destruir as tropas sírias, e foi declarado ditador vitalício. A nomeação, no entanto, não foi aceita pela maioria dos patrícios. César, em 44 a.C, foi assassinado.

Após a morte de César, teve início uma grande revolta popular, que foi habilidosamente utilizada por Marco Antônio, um dos generais mais próximos de Júlio César. Junto com Lépido e Otávio (imagem ao lado), Marco Antônio formou o 2º Triunvirato.

O trio, a princípio, trabalhou em conjunto, “eliminando” os opositores. Porém, depois que o controle ficou na mão dos três generais, um começou a lutar contra o outro.

O vencedor foi Otávio, recebendo do Senado o título de “Primeiro Cidadão” (Princeps), primeira escala para atingir o título de Imperator. Dessa forma, Otávio foi tornando-se praticamente o "senhor de Roma", coroado pelo recebimento do título de divino (Augustus), passando a se chamar Otávio Augusto.

Tinha início o 3º período da Roma Antiga, o período imperial.

Além do mais

Desde pequeno tinha um sonho. Visitar Roma e conhecer o Coliseu. Quem sabe um dia eu realizo esse feito. Por enquanto, faço um relato dessa impressionante obra.

O Coliseu foi construído quando Roma já era um império, durante o governo de Vespasiano (9 d.C. - 79). As medidas impressionam: suas fundações possuem mais de doze metros de profundidade e o perímetro da construção é de cerca de quinhentos e quarenta metros. Achou pouco? Mais de 50 mil pessoas poderiam assistir confortavelmente aos espetáculos, muitas vezes com gladiadores lutando até morte. Outras vezes, jaulas surgiam do subterrâneo e os animais eram soltos na arena, perseguindo os escravos. Espetáculos violentos!

A construção era feita de cimento natural, com a presença de cinco anéis concêntricos. Uma maravilha arquitetônica!




[i] Pedro Henrique Maloso Ramos

[ii] Leoni, G. D. “A Literatura de Roma” – 6ª ed. – São Paulo: Livraria Nobel S. A., 1961. p. 31

Texto-base: SD "OS Brasis antes do Brasil" - 7º ano

Antes de ser América[i]


De  todos  os  eventos  registrados  durante  a  Expansão   Ultramarina  o descobrimento da América talvez seja um dos mais impressionantes. Aos olhos dos navegadores europeus um “Novo Mundo” surgia, derrubando teorias e paradigmas, redefinindo maneiras de se enxergar o Homem. As populações nativas americanas causaram espanto e mostraram outras (possíveis) formas de organização e convívio sociais nunca imaginadas pelo homem europeu, recém-saído do universo medieval.

Nesse texto, dividido em dois blocos, iremos primeiramente falar  das comunidades nativas americanas (especialmente dos tupinambás). E, em um segundo momento, do trágico episódio da conquista da América pelos europeus.

Os tupinambás

Poderíamos aqui falar de inúmeras comunidades  nativas  americanas. Da maravilhosa e fascinante cultura Sioux, indígenas que habitavam as planícies norte-americanas, caçando búfalos. Ou mesmo dos Incas, povo fascinante que habitava praticamente toda a região andina, responsáveis por uma cultura maravilhosa, capaz de projetar cidades com água potável e à prova de abalos sísmicos. No entanto, para que o nosso texto não se torne um livro iremos falar de uma das comunidades nativas americanas: os tupinambás. No momento em que Cabral e seus comandados aqui pisaram os tupinambás eram considerados os “senhores do litoral”[ii]. “A cultura tupi-guarani ter-se-ia formado há mais de três mil anos, na Amazônia central[iii], chegando posteriormente ao litoral.

Os tupinambás viviam em aldeias com cerca de cinquenta indivíduos, sendo as mesmas circulares e protegidas por paliças de troncos, com fossos que continham pedaços pontiagudos de madeira. A vida comunitária estava diretamente ligada e estruturada na produção agrícola, além da caça, da pesca e da coleta de frutos silvestres. A técnica agrícola utilizada pelas comunidades tupinambás consistia em atear fogo a uma determinada região em que a mata havia sido previamente derrubada. Depois limpavam a área e iniciavam o plantio, cultivando mandioca, batata-doce, vagens etc. Essa técnica é conhecida como coivara.

Os tupinambás não possuíam animais de transporte e nem a criação dos mesmos. As aldeias não ficavam sempre no mesmo lugar. Assim que o solo ou os recursos se esgotavam, os tupinambás partiam para uma outra região.

A sociedade tupinambá era formada por excelentes pescadores, nadadores, mergulhadores e caçadores. “Construíam jangadas e canoas cavadas em troncos de certas árvores. Durante as viagens nas canoas, os homens esvaziavam com as cuias a água que entrava nas embarcações.

Os tupinambás conheciam a cerâmica, a cestaria, o trabalho com algodão e fabricavam armas e instrumentos domésticos e musicais.

Manejavam com grande habilidade suas armas de caça e de guerra – tacapes, arcos, flechas, escudos, machados de pedra polida etc. Nas batalhas soavam tambores, flautas, cornetas e buzinas[iv]. Praticavam rituais antropofágicos.

A conquista da América

Vimos anteriormente que, quando os europeus chegaram ao Novo Mundo, as terras já eram habitadas. No entanto, a ocupação europeia foi feita desrespeitando qualquer cultura ou sociedade existente no Novo Mundo. “Inicialmente, a própria presença física do europeu no continente foi responsável por milhares de mortes em virtude de várias doenças. A varíola, a pneumonia, a gonorreia, o tifo e a gripe devastaram populações inteiras. Por outro lado, os europeus eram vulneráveis à sífilis, que causou a morte de milhares deles[v].

Uma das populações que foi praticamente eliminada durante o processo de conquista foi a dos tupinambás. Como definimos, os tupinambás controlavam praticamente todo o litoral brasileiro, uma cultura milenar arrasada em meio século após a chegada dos portugueses ao Brasil. O quadro era tão assustador que em 1584 o padre Fernão Cardim registrou espantado o extermínio: “e eram tanto os dessa casta que parecia impossível poderem se extinguir[vi].

Ao lado, ilustração de Theodore de Bry mostrando o extermínio de uma comunidade indígena.

As formas de execução que os indígenas sofriam eram as mais variadas e cruéis possíveis. Crianças eram separadas de suas mães, homens e mulheres eram escravizados, aldeias eram atacadas durante a noite e o dia.

Infelizmente o extermínio indígena não foi apenas uma característica da colonização portuguesa. Tornou-se comum por toda a América, eliminando diversas etnias. Veja o relato abaixo, referente à colonização espanhola:

As campanhas do espanhol Fernão Cortez (imagem), em 1520, para ocupar as terras americanas demonstravam a violência usada pelos conquistadores. Ele invadiu o México combatendo contra a sociedade asteca, massacrando-a. na década de 1530 foi a vez de Francisco Pizzaro massacrar o povo inca, em busca das minas de ouro e prata no Peru e na Bolívia. Inúmeras nações indígenas foram totalmente obrigadas a abrir mão de suas crenças religiosas. Esse verdadeiro horror que o conquistador europeu causou aos povos americanos ficou muito claro no relato feito pelo frei Bartolomé de Las Casas: “(...) os espanhóis, esquecendo que eles eram homens, trataram essas inocentes criaturas com crueldade digna de lobos, de tigres e de leões famintos (...) não deixaram de os perseguir, de os oprimir, de os destruir com todos os meios criados pela cobiça humana e por outros que se quer chegaram a imaginar; hoje não se conta senão duzentas indígenas na Ilha Espanhola (São Domingos) que outrora abrigava três milhões (...)”[vii].

Não à toa, a marca da conquista foi o extermínio de milhares (milhões talvez) de indígenas, dos incas aos tupinambás, dos jês aos iroqueses, dos astecas aos sioux. Conquista que se estendeu por longos e agonizantes séculos, manchada com o sangue indígena. Por esse motivo afirmamos que as civilizações indígenas americanas não morreram de morte natural. Elas foram assassinadas!



[i] Pedro Henrique Maloso Ramos

[ii] Moraes, José Geraldo Vinci de. “Caminhos das civilizações: da pré-História aos dias atuais”. São Paulo: Atual, 1993. pp. 157 - 158

[iv] Moraes, José Geraldo Vinci de. “Caminhos das civilizações: da pré-história aos dias atuais”. São Paulo: Atual, 1993. p. 157.

[v] in Maestri, M. “Terra do Brasil: a conquista lusitana e o genocídio tupinambá” – São Paulo: Moderna, 1993. p. 83

[vi] in Maestri, M. “Terra do Brasil: a conquista lusitana e o genocídio tupinambá” – São Paulo: Moderna, 1993. p. 88