Atividade
Corsária no Litoral da América Portuguesa: os franceses na baía de Guanabara –
2ª parte
A
França Antártica – Precedentes internos à colônia[1]
No texto passado[2]
abordamos assuntos ligados às beligerâncias marítimas no tocante à invasão dos
franceses na América Portuguesa. No presente texto, faremos uma análise
pormenorizada dos precedentes internos à colônia.
O interesse dos franceses pelo sul da colônia
deu-se após 1530, quando seus navios corsários e piratas passaram a agir no
litoral do Rio de Janeiro, onde as relações entre esses e os indígenas eram
pacíficas. Max Fleiuss, em sua História
da Cidade do Rio de Janeiro, descreve trocas comerciais que confirmam tal
passividade: “Avisados da chegada de um navio francez, por disparos das peças
de bórdo, acudiram á praia dos selvagens para faze troca de pau-brasil (...) e
outros produtos da terra por (...) utensílios domésticos”[3].
A baía de Guanabara em
1828. Ilustração de Félix Taunay.
Os franceses nunca
concordaram propriamente com a divisão do mundo entre Portugal e Espanha, não
permitindo a seu reino nenhum aproveitamento das colônias descobertas no
ultramar. Assim, praticavam o corso e a pirataria na América, principalmente na
parte pertencente a Portugal, desde o começo do século XVI. “A corte francesa
nunca aceitara de bom grado a doutrina do ‘mare
clausurum’, custando a reconhecer que a rota do Atlântico estivesse barrada
aos seus navios, enquanto as duas metrópoles ibéricas continuavam a alargar as
suas áreas de dominação ultramarina” [4].
O questionado e
questionável Tratado de Tordesilhas.
Durante os reinados de D.
João III, em Portugal, concomitante ao de D. Francisco I, na França, as
relações entre os dois reinos não estavam tão tensionadas, em decorrência de um
tratado de paz e aliança assinado pelas mesmas, em 14 de julho de 1536, no
condado de Lyon, o que explica o porquê, entre 1540 e 44, “haja poucas notícias
de navios franceses nas águas do Brasil, o que também se compreende perante as
dificuldades de Francisco I na luta acesa que então mantinha, ao longo das
fronteiras da França, com o imperador Carlos V” [5];
em tal luta, a França procurava evitar o envolvimento de Portugal, o que
propiciou vários acordos diplomáticos que acalmaram, em parte, as relações
entre portugueses e franceses, tanto no continente quanto no ultramar.
Contudo, a represália que
navios mercantes franceses e portugueses exerciam entre si agravavam novamente
as relações entre os respectivos reinos, no final da década de 40, situação que
fez renascer na França a política de infiltração ao litoral da colônia, que
fora suspensa após a repressão portuguesa por meio das expedições de Cristóvão
Jacques, em 1527, e de Martin Afonso de Souza, em 1532, contra os corsários e
piratas franceses na região colonial. Assim, os corsos e a pirataria foram
estimulados na França, desta vez com maior intensidade, sendo a região do Rio
de Janeiro, principalmente o Cabo Frio, alvo de constantes ataques por parte
destes.
Região de Cabo Frio, alvo
dos franceses nos primórdios da colonização[6].
Outro fator agravante, que
preocupava muito os colonos, era o fato de as capitanias do sul ter parcos
recursos de defesa. As capitanias do norte, que por terem se estabelecido
primeiro e por fazerem parte do centro produtor da colônia, já gozavam de uma
infra-estrutura muito mais elaborada que as do sul, o que permitia que melhor
se defendessem dos contrabandistas; assim, a organização defensiva das
capitanias do norte incitava os corsários e piratas a agirem no sul, onde a
chance de sucesso era relativamente maior em função da precária estrutura
defensiva da região.
“Enquanto a ameaça se
dirigia somente para as capitanias do norte, tinham podido os capitães, com
maior ou menor dificuldade, proteger a terra; mas redobrando a audácia dos
corsários para o sul do Cabo de Santo Agostinho, onde eram mais precárias as
condições de defesa, essas capitanias ficavam à mercê dos atacantes” [7].
As cartas dos colonos à D.
João III eram constantes e numerosas, em que pediam seu auxílio, colocando o
risco de perda da terra: “... se com tempo e brevidade Vossa Alteza não socorre
a estas capitanias e costa do Brasil que ainda que nós percamos as vidas e
fazendas Vossa Alteza perderá a terra...” [8].
Quando da chegada de Tomé
de Souza, em 29 de março de 1549, para a instalação do Governo Geral, a
prioridade do primeiro governador da colônia era a defesa do litoral e expulsão
dos corsários; para tal empresa, Tomé de Souza procurava estimular o povoamento
da região do Rio de Janeiro, dando autorização aos mercadores portugueses para
explorarem pau-brasil da região, fazendo com que a presença destes afastasse os
contrabandistas franceses. Mas não foi apenas com relação ao Rio de Janeiro que
o governador tomou providências para a defesa, “teve uma visão unitária do
Brasil, não se poupando a esforços na guarda de toda a linha da costa” [9].
Contudo, os interesses da coroa portuguesa pareciam estar voltados apenas à
defesa das capitanias do norte, apesar dos esforços do governador em
conscientizar o rei a respeito da defesa das capitanias do sul.
A tensão na colônia sofreu
forte acréscimo com a chegada do segundo governador, Duarte da Costa, em cujo
governo se deu a invasão dos franceses à baía de Guanabara e sua consequente
instalação; a falta de competência administrativa do governador, somada à escassez
de recursos de defesa por parte da metrópole permitiram aos franceses a invasão
e fixação sem grandes dificuldades.
Pau-brasil, procurado por portugueses e
franceses[10].
[1] RAMOS, Juliana Maria de Carvalho
[2] http://respirehistoria.blogspot.com.br/2015/02/atividade-corsaria-no-litoral-da.html
[4] SERRÃO, Joaquim Veríssimo. O Rio de
Janeiro no século XVI – I – Estudo Histórico; p. 45
[5] SERRÃO, Joaquim Veríssimo. O Rio de
Janeiro no século XVI – I – Estudo Histórico; p. 45
[6] Imagem extraída do sítio http://loucosporpraia.com.br/praia-das-conchas-cabo-frio/
[7] SERRÃO, Joaquim Veríssimo. O Rio de
Janeiro no século XVI – I – Estudo Histórico; p. 46
[8] http://historia.abril.com.br/gente/tome-souza-salvador-patria-480973.shtml
[9] SERRÃO, Joaquim Veríssimo. O Rio de
Janeiro no século XVI – I – Estudo Histórico; p. 47
[10]
Imagem extraída do sítio
https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiL-Kii9Z-a9JojxO4I9wnzJVrJxOGOxrLoiDlkSaB_lb3DChQFFzQ9JiiUDja4MB1bxbGUObldi40BuB5DvNfDyllcVL6wXuJLBVza7ra15RTQaZW_IMcghlpB9Ub-eI5Xthw_gkneCA/s400/pb.jpg
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