28º Texto: a expedição de Martim Afonso de Sousa e
as bases econômicas da colonização
A
expedição que viria colonizar o Brasil foi organizada sob e com a interferência
do rei português D. João III, que passou a ser conhecido como O Colonizador,
buscando, portanto, ocupar as terras oficialmente. Foi comandada por Martim
Afonso de Sousa e contava com cinco embarcações – um galeão, duas caravelas e
duas naus – e mais de 400 pessoas à bordo.
Durante
a viagem ao Brasil, os portugueses combateram e capturaram alguns navios
franceses em águas brasileiras, bem como exploraram o rio da Prata, no sul do
continente americano. Sabemos que a exploração desse rio foi um dos principais
motivos da viagem de Martim Afonso de Sousa, já que se acreditava ser o Prata
um dos caminhos para as regiões ricas em metais preciosos da América andina.
Cerca de um ano depois de sua partida de Portugal, Martim Afonso de Sousa
fundou, em janeiro de 1532, a vila de São Vicente, o primeiro núcleo efetivo
dos portugueses no Brasil.
Martim
Afonso chegou à colônia com poderes judiciais sobre os demais homens que
auxiliariam na colonização, bem como sobre os nativos e portugueses que
habitavam o Brasil. Também ficou sob sua responsabilidade a missão de criar
cargos judiciários e administrativos, necessários para o processo de
colonização, e iniciar a distribuição de terras entre os colonizadores.
Ao
redor da vila fundada por Martim Afonso de Sousa foram se organizando os
primeiros engenhos de açúcar – base econômica do início da colonização.
Discutiremos isso à frente, mas é importante enfatizarmos que os engenhos
portugueses foram em grande parte construídos graças ao capital holandês. A cana-de-açúcar também
foi introduzida no Brasil por Martim Afonso de Sousa, dono do primeiro engenho
erguido na colônia, e auxiliado pelo capital do holandês Johann van Hielst –
conhecido pelos portugueses como João Vaniste.
Há
uma explicação para a interferência e participação dos holandeses,
principalmente no início da colonização. Portugal enfrentou significativos
problemas ao iniciar a colonização, sendo que um dos maiores remetia à falta de
capital (dinheiro) para colocar em prática o projeto colonizador. É nesse ponto
que temos a participação dos holandeses, em sua maioria banqueiros e mercadores
que, havia tempos, estavam associados com os portugueses, e passaram a financiar
as construções dos engenhos e de outras inúmeras atividades econômicas da
colônia.
Representação
de um engenho de açúcar do período colonial. Dê uma olhada na evidente relação
com o trabalho escravo.
Vários
fatores justificam a escolha da cana-de-açúcar como mercadoria a ser produzida
na colônia. Portugal já havia iniciado a produção de açúcar, através do cultivo
da cana-de-açúcar, antes do descobrimento do Brasil. O açúcar português era
produzido nas ilhas de Madeira, Açores e Cabo
Verde.
Portanto,
não se tratava de uma atividade agrícola e comercial desconhecida. Atrelado a
isso está o fato de que o açúcar se tratava de
uma especiaria, “dono” de um mercado em expansão na Europa. Mas um dos
fatores mais determinantes foi a semelhança entre os climas e condições
ecológicas das ilhas atlânticas e do Brasil, principalmente do nordeste
brasileiro, muito favoráveis ao plantio de cana-de-açúcar.
A
fundação dos engenhos de açúcar tinha como objetivo povoar a colônia e
assegurar a posse para os portugueses. Os engenhos se encaixavam no sistema
econômico das plantations, ou seja, extensas plantações de um determinado
gênero agrícola – no caso, a cana-de-açúcar –, produzindo mercadorias que
fossem exportadas para o mercado europeu. Em decorrência desse sistema, as
plantations[1]
faziam com que em todas áreas onde fossem implantadas, a policultura se
tornasse atividade de caráter secundário e extremamente restrito.
A
pecuária nordestina foi importante como atividade secundária. De grande
importância na produção e manutenção do sistema açucareiro, na medida em que o
gado criado em áreas próximas às plantações de cana- de-açúcar e aos engenhos
era utilizado como força motriz para movimentar as moendas, meio de transporte
para levar cargas e trabalhadores, vestuário – com a utilização do couro do
animal – e fonte de alimento. A interiorização da pecuária se tornou um
processo de singular importância na ocupação de novas terras pelos portugueses,
como veremos.
Podemos
resumir o sistema de plantations da seguinte maneira: uma grande propriedade
agrícola, trabalhada em sua imensa maioria por escravos, com tendência a
autossuficiência, cuja produção se voltava quase que exclusivamente para o
mercado externo.
A escravidão, o engenho
de açúcar e a mão de obra
O
engenho de açúcar exigia um grande contingente de trabalhadores para que fosse
efetivamente realizada a produção do açúcar. Desde o plantio até as atividades
dentro do engenho eram necessários muitos trabalhadores. Esses trabalhadores
foram os escravos.
Os
primeiros escravos no Brasil não foram os negros e sim os índios. O processo de
escravização indígena resultou no primeiro grande genocídio português realizado
na colônia. Durante o processo de colonização, muitas tribos foram dizimadas –
principalmente as que praticavam rituais antropofágicos -, outras tantas
tiveram que fugir para áreas interioranas, onde acabaram sendo caçadas –
literalmente! É esse o termo – pelos bandeirantes. Sabemos também que muitas
das doenças trazidas pelos europeus mataram centenas de milhares de indígenas.
O processo de escravização indígena ocorreu pelo fato de que o escambo passou a
deixar de funcionar. A partir do momento em que as mercadorias portuguesas não
mais atraíam a curiosidade dos índios e que o ritmo de trabalho exigido pelos
portugueses não se encaixava no cotidiano dos nativos, fez-se necessária a adoção
da escravidão para manter os interesses portugueses.
Tanto
as Guerras Justas quanto as Expedições de Apresamento, realizadas em grande
parte pelos bandeirantes paulistas, tiveram papel de destaque na consolidação
da escravidão indígena.
As
Guerras Justas se davam quando a Coroa Portuguesa autorizava o ataque a tribos
indígenas que haviam atacado vilas e colonizadores; ou aos índios que
praticavam rituais antropofágicos e não se submetiam ao domínio português.
Muitos dos índios morriam nesses conflitos, mas aqueles que eram capturados se
tornavam escravos. Já as Expedições de Apresamento eram diretamente feitas para
capturarem indígenas e torná-los trabalhadores escravos.
Qual
seria o motivo que levou ao fim da utilização dos indígenas como escravos? A explicação
do fim da utilização dos índios no processo de escravidão foi o fato de que
essa atividade estava centrada como um negócio praticamente interno à colônia,
trazendo uma reduzida margem de lucro ao comércio marítimo e à metrópole. A
escravidão indígena, de certo modo, impedia o enriquecimento da burguesia
lusitana. A própria Igreja Católica perdia significativas quantias de dinheiro
com a não utilização dos escravos negros, já que possuía uma pequena parcela de
lucro em cada homem, mulher e criança negros que fossem escravizados e levados
ao Novo Mundo. Portanto, tanto para burgueses, quanto para clérigos e para o
rei português, a escravidão negra tratava-se de um negócio muito mais rentável.
Representação de um engenho de açúcar do período colonial.
Representação
do comércio triangular, onde o tráfico e comércio de escravos era um dos
vértices do triângulo.
Conhecida por Portugal desde antes do descobrimento do
Brasil, a escravidão negra veio com a ocupação portuguesa de faixas litorâneas
do continente africano. A Igreja Católica havia garantido monopólio desse tipo
de atividade à monarquia portuguesa, fazendo com que muitos homens negros
fossem introduzidos em Portugal como escravos domésticos. A utilização do
trabalho escravo negro se deu também nas ilhas atlânticas.
Mas
a égide da questão da utilização dos negros como escravos – e, em especial, do
tráfico negreiro – está sustentada no conhecido comércio triangular.
Resumidamente, poderíamos afirmar que o negro era uma das moedas que
possibilitavam o comércio marítimo entre a América, a África e a Europa.
O
desembarque desses homens era realizado nas áreas portuárias, principalmente do
Nordeste brasileiro, região que mais recebeu escravos no início da colonização.
Nos portos era possível perceber o desenvolvimento de um intenso e movimentado
comércio. Escravos eram trocados por cachaça, tabaco e outros produtos. Até o
final do século XVII a média de escravos negros trazidos para o Brasil chegava
próximo aos 8.000 homens por ano.
Os
escravos constituíram a base do sistema produtor de açúcar, bem como da
estrutura colonial. Em grande medida, foram esses homens que possibilitaram o
sucesso do projeto colonizador. Os engenhos de açúcar eram, na maioria,
movimentados pelo braço do negro escravizado.
O
comércio de escravos ocorria nas vilas litorâneas das áreas metropolitanas e
coloniais e envolvia a troca de mercadorias entre a América, a Ásia e a Europa.
As capitanias
hereditárias
Para
efetivamente colonizar a grande extensão colonial, a monarquia portuguesa
escolheu o sistema de Capitanias Hereditárias, que já havia sido utilizado, com
relativo sucesso, em algumas outras áreas coloniais de Portugal. A chegada de
Martim Afonso de Sousa oficializou o início da montagem do sistema colonial,
fazendo com que as terras fossem divididas em 15 lotes, doados a 12 capitães
donatários (portanto, houve casos de donatários que receberam mais do que um
lote). Esses capitães assumiriam a responsabilidade – quase que em todas as
esferas – de fazer com que a colonização de seus lotes ocorresse e que esses se
tornassem rentáveis do ponto de vista mercantil. Os cargos de donatários eram
vitalícios e hereditários. Voltaremos a falar dos capitães donatários.
O
processo de ocupação de um lote era, de fato, oneroso e complicado. Buscando
“convencer” os donatários a assumirem suas Capitanias, a Coroa Portuguesa criou
uma série de vantagens, dentre as quais o fato dos donatários terem o direito
de escravizar as populações indígenas, desde que enviassem à Coroa Portuguesa
uma parte da renda conseguida nesse comércio, bem como alguns escravos
indígenas. Os donatários poderiam doar sesmarias - lotes de terras - a quem se
interessasse em cultivá-los. No entanto, a doação só poderia ser feita aos
cristãos portugueses. A distribuição de terras ficava sob a responsabilidade do
donatário, o que não quer dizer que o mesmo fosse proprietário das terras.
Todas as terras das Capitanias Hereditárias pertenciam ao rei português. Os
donatários atuariam como administradores das terras reais.
A
princípio, a Coroa Portuguesa havia “convidado” membros da alta nobreza para se
tornarem donatários na nova missão colonizadora em que Portugal embarcara. O
desinteresse foi tanto, que a Coroa Portuguesa fez dos militares e navegadores
ligados ao comércio oriental alguns dos seus capitães donatários. O maior ônus
para os capitães donatários estava no fato de que grande parte da colonização
se daria por investimentos próprios, e a grande maioria desses homens não
possuía capital suficiente para tocar um projeto de tal envergadura.
Muitos
donatários – inclusive o donatário Martim Afonso de Sousa -, no intuito de
iniciar a colonização de seus lotes, buscaram fazer empréstimos de banqueiros e
negociantes – principalmente judeus - de Portugal e da Holanda. Mesmo assim,
uma significativa parcela desses homens nunca chegou a pisar na colônia. Um dos
maiores receios estava no fato de que o dinheiro aplicado nos lotes não gerasse
o devido retorno. E dos que chegaram a iniciar a colonização dos lotes recebidos,
poucos foram os que obtiveram sucesso. O fracasso vinha por diversos motivos:
terras inóspitas, índios hostis, distância entre as capitanias, dificuldade em
defender as vilas etc.
Além do mais...
Hoje
trataremos dos Jesuítas.
No
século XVI a Igreja Católica havia criado, através de Inácio de Loyola, a
Companhia de Jesus, um dos órgãos que combateria a expansão do protestantismo.
Pois bem, a ação dos jesuítas (os homens dessa Companhia), também ocorreu na
América Portuguesa (e na América Espanhola. Junto com outros colonizadores, os
jesuítas também eram responsáveis pela evangelização dos índios) e estiveram
profundamente envolvidos com a formação da sociedade colonial. Ficaram
responsáveis por levar a doutrina católica a todas as outras partes do mundo.
Mas
a relação dos jesuítas com a Coroa Portuguesa e os colonizadores não foi nada
fácil. Esses membros da Igreja Católica entraram em conflito
com os colonos, pois defendiam
o fim da escravidão indígena. Mas a
própria ideia do
fim da escravidão colocada pelos jesuítas era contraditória. Organizando aldeamentos
indígenas, as missões, os
jesuítas evangelizavam os índios e
estes trabalhavam gratuitamente (sendo muitas vezes forçados) na construção e fundação de vilas. A
cidade de São Paulo foi fundada pela ação jesuítica, impulsionada pelo trabalho
e catequização dos índios. Veja o que escreve Cáceres:
“Os jesuítas exerceram uma proteção vigilante
e tirânica sobre os índios de suas missões. Os indígenas eram forçados a viver
nas aldeias e a trabalhar na terra e no artesanato, sob castigos e punições
corporais”[2].
Exercícios de revisão
1)
Faça um resumo sobre as principais características da colonização portuguesa no
Brasil.
[1] fica clara a intensa
relação entre relação cultivo da cana, o engenho e a plantation, bases do
processo colonizador português
[2] Cáceres,
Florival. História do Brasil. Editora Moderna. p. 74
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