O governo de Getúlio Vargas a partir de 1937
O presente texto pode ser
iniciado com a seguinte ideia: o modelo de modernidade proposto e tão propalado
por Vargas desde a sua chegada ao poder é, no mínimo, questionável. Se, por um
lado, Vargas iniciou um incipiente processo de modernização na estrutura
política brasileira, com a criação de ministérios, a possibilidade de
sindicalização dos trabalhadores (mesmo que com limites bem definidos) e um
incentivo à industrialização, o presidente manteve uma política de apoio à
elite cafeeira, denotando muito mais uma busca por apoio político, bem como
instituiu, em um curto período de tempo, medidas que o levariam a permanecer
como presidente até 1945. Ou seja, apesar de aprovado o voto secreto e a
participação das mulheres como eleitoras, Vargas usou de mecanismos nada
democráticos para manter-se no poder. Em 1937 tinha início o Estado Novo.
O Estado Novo (1937 – 1945)
Meses antes das eleições presidenciais, que ocorreriam em janeiro de
1938[1],
mais precisamente em 30 de setembro de 1937, a denúncia de um suposto plano comunista
visando tomar o poder, o chamado Plano Cohen, fez com que os rumos da
presidência fossem decididos antes mesmo da corrida eleitoral.
A ideia de Vargas foi claramente de causar uma comoção popular que
justificaria o golpe de estado do Estado Novo. Havia relampejos na política
brasileira das experiências trazidas com a Revolução Russa, ocorrida em 1917. Prova
disso foi o fato de que a população realmente deu crédito à história veiculada
(e forjada) pelo governo varguista. Havia ainda a Intentona Comunista, que
traria mais dramaticidade à situação. À frente, trataremos da Intentona
Comunista.
Assim, coube a Vargas apenas fazer um pronunciamento transmitido pelo
rádio para todo o Brasil, instaurando uma ditadura no dia 10 de novembro de
1937, uma quarta-feira. Vargas aparecia como o salvador do Brasil ante as ameaças comunistas que
perturbavam o sono de alguns brasileiros.
Como todo regime
ditatorial, o Estado Novo ficou marcado pelo fechamento do Congresso Nacional,
das Assembleias Legislativas, da Câmara dos Deputados, além de uma ampliação do
poder de Vargas e o fim de todos os partidos e organizações civis. Nesse
contexto, foram criados o Tribunal de Segurança Nacional, visando manter fora
de cogitação qualquer movimentação contrária ao governo de Vargas, bem como o
Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP), que além de controlar rádios e
jornais, promovia Vargas através de um dos principais veículos de comunicação
da época, o rádio.
Aliás, o rádio, como o
que aparece abaixo, aparelho da década de 30, foi, indubitavelmente, um dos
principais “aliados” de Vargas durante o Estado Novo. Foi através dele que
Vargas construiu uma imagem que, mesmo após 60 anos da sua morte, permanece
viva na cabeça de alguns brasileiros: a de “pai dos pobres”.
Getúlio Vargas sustentou
sua propaganda populista com a ideia de uma nação soberana (assim como faziam
os fascistas Mussolini e Hitler), enquanto controlava a máquina do Estado de
forma autoritária, criando o Departamento Administrativo de Serviço Público
para fiscalizar os governos estaduais. O interessante é pensar como as
conjunturas internacionais estavam tão vivas em nosso país. E no mesmo período
em que afloravam na Europa.
O governo de Vargas era tão centralizador que chegou a fechar
todos os sindicatos, e as organizações trabalhistas passaram a ser entendidas,
tratadas como patrimônio do Estado, ou seja, só o governo poderia opinar,
liderar, interceder.
No entanto, Vargas sabia que o daria suporte ao seu
governo era a ideia de um gestão forte, porém empenhada em proteger e promover
o trabalhador brasileiro. Por isso, em 1943, editou a Consolidação das Leis de
Trabalho, que atendeu a ala operária e lhe deu o apelido de “pai dos pobres”.
Fato é que Vargas vivia a terrível dicotomia de um governo ditatorial que,
dentro de alguns anos, lutaria contra governos ditatoriais...
Foi a 2ª Guerra Mundial um dos eventos que fez com que
Vargas visse seu governo desmoronar. E o presidente brasileiro tinha
consciência de que tal situação poderia ocorrer, tanto que relutou e muito em
entrar no conflito, só o fazendo dada às pressões nacionais e internacionais,
estas lideradas pelos EUA. Prova da relutância de Vargas quanto à entrada no
conflito pode ser facilmente exemplificada por essa frase dita pelo próprio
Getúlio sobre a presença ou não do Brasil na 2ª Guerra Mundial.
“Parece-me que os
americanos querem nos arrastar à guerra, sem que isso seja de utilidade, nem
para nós, nem para eles!”
A neutralidade do Brasil frente ao conflito durou
até 1941. A partir dos ataques à Pearl Harbor, base militar estadunidense no
Oceano Pacífico, os países participantes da Conferência Pan-Americana, que
ocorria no Rio de Janeiro, em janeiro de 1942, decidiram condenar as ações das
nações que compunham o
Eixo (a saber, Japão, Alemanha e Itália), bem como apoiar uma intervenção
militar do EUA na Europa, seja fornecendo equipamentos, logística, ou até mesmo
enviando tropas. Vargas relutou e muito na tomada de decisão quanto ao que e
como se posicionar. Mas ficaria muito mal para o seu governo ir contra um
posicionamento geral dos países americanos (fortemente influenciados pelos EUA,
é verdade), ainda mais em casa, uma vez que a Conferência ocorreu no Rio de
Janeiro. Novamente, Vargas não tardou em mostrar ciência quanto aos efeitos em
entrar em uma guerra contra ditaduras vivendo em uma ditadura.
“Devo
confessar que me invade uma tristeza. Grande parte desses elementos que
aplaudem esta atitude (romper relações diplomáticas com a Alemanha), alguns
poucos que até me caluniam, são os adversários do regime que fundei (o Estado
Novo), e chego a duvidar que possa consolidá-lo para passar tranquilamente o
governo ao meu substituto.” (27/01/1942).
O
evento que coroaria a participação brasileira na 2ª Guerra Mundial ocorreu no
início de 1943, mais precisamente em 28 de janeiro daquele ano. Vargas e o
então presidente estadunidense, Franklin Delano Roosevelt, encontraram-se em
Natal para a uma Conferência, a Conferência de Natal. Apesar de haver declarado
guerra à Alemanha e à Itália em agosto de 42, foi nesse encontro que os EUA
conseguiram concretizar um importante projeto, já iniciado na Conferência: o
estabelecimento de uma importante base militar no nordeste brasileiro, um aeroporto
na cidade Parnamirim, bem próxima à Natal, capital do Rio Grande do Norte. No
referido período os EUA tinham interesse em construir um aeroporto no litoral
nordeste brasileiro para que assim as distâncias entre a América e o Continente
Africano, onde se desenrolavam parte das ações dos aliados, fossem reduzidas,
permitindo o deslocamento de equipamentos com maior facilidade.
E, de
fato, o aeroporto foi muito utilizado pelos EUA. Durante a 2ª Guerra Mundial, o
aeroporto Internacional Augusto Severo foi o mais utilizado do mundo! Abaixo,
imagem do Parnamirim Field. Mecânicos
brasileiros chegaram a receber curso para aprender o funcionamento dos motores
dos aviões estadunidenses[2].
Nesse mesmo encontro, em
Natal, fora criada a FEB (Força Expedicionária Brasileira), e, apesar das
descrenças dos aliados, o Brasil enviou sim soldados para lutar na Europa
contra as nações que compunham o Eixo.
Abaixo, imagem de ambos
os presidentes. Sentado à esquerda, Vargas. E à direita, o presidente dos EUA,
Franklin D. Roosevelt.
A 2ª Guerra Mundial e o fim do Estado Novo
Os movimentos de oposição
à Vargas ganharam significativo volume a partir de 1943. E isso ocorria entre
os mais diversos setores. Vide esse caso. “Entre os pracinhas da FEB, havia
oito estudantes de Direito da Universidade de São Paulo, participantes
de manifestações pacíficas de oposição a Getúlio, como a Passeata do
Silêncio, em que desfilaram com mordaças negras para simbolizar a falta
de liberdade de
expressão”[3].
O
ano de 1943 deflagra o primeiro protesto organizado contra o Estado Novo.
Ocorrido em Minas Gerais, foi chamado de “Manifesto dos Mineiros”, e contou com
a organização e assinatura de diversos advogados mineiros, sendo que alguns
seriam decisivos nos rumos da política do Brasil após a queda do Estado Novo.
Junto a esses manifestantes, tínhamos a presença de Monteiro Lobato, que chegou
a ser preso pelo governo getulista.
Com
o fim da 2ª Guerra Mundial as pressões para a queda de Getúlio se
intensificaram. O começo de 1945 foi marcado por uma tentativa de Vargas de
apaziguar a situação. Houve a definição, “em 28 de maio de
1945, de uma data para as eleições presidenciais (2 de dezembro),
a anistia a
Luís Carlos Prestes e outros presos políticos, a liberdade de organização
partidária, e o compromisso de fazer eleger uma nova Assembleia Constituinte”[4], mas
nada disso diminuiu o quadro de tensão. Em 29 de outubro de 1945 Getúlio Vargas
foi deposto por um movimento militar liderado por generais que compunham seu
próprio governo. Tal ação ocorreu porque os militares não aceitaram a nomeação
de um dos irmãos de Getúlio, Benjamim Vargas, para chefe de polícia do Rio de
Janeiro.
Getúlio
foi então substituído pelo presidente do Supremo Tribunal Federal, já que não
tínhamos a figura de vice-presidente na Constituição de 1937. O poder ficou nas
mãos de José Linhares até o dia 2 de dezembro de 1945, quando assumiu Eurico
Gaspar Dutra.
A Intentona Comunista
Desde 1934, momento em
que se iniciou o Governo Constitucional, podemos afirmar que surgiram
movimentos contra o governo de Vargas. A Intentona Comunista foi um desses
movimentos, visando derrubar o presidente e tomar o poder. Foi liderada pela
Aliança Nacional Libertadora (ANL), uma organização contrária aos movimentos de
extrema direita que apareciam no Brasil, sendo estes liderados pela Ação
Integralista Nacional.
Fato é que o governo de
Vargas agiu muito rapidamente, sendo relativamente curto o êxito atingido pelos
revoltosos, indo de 23 de novembro a 27 de novembro de 1935. A ANL, no entanto,
foi um movimento que deixou marcas na história do Brasil. Apoiados por Luís
Carlos Prestes, os revoltos receberam ajuda militar (agentes vieram treinar os
revoltos) e dinheiro da URSS.
Com a ação do governo
Vargas, Prestes foi preso, e o governo assumiu ainda mais um caráter
autoritário, abrindo caminho (e criando argumentos) para o golpe de estado em
1937.
Abaixo, desenho representando
o lema da ANL[5].
[1] Na disputa estavam José
Américo de Almeida, situacionista, e Armando de Sales Oliveira, oposicionista
[2]
MEDEIROS, Rostrand. Fotos de Parnamirim Field na Segunda Guerra Mundial.
Disponível em: <https://tokdehistoria.com.br/2013/09/30/fotos-de-parnamirim-field-na-segunda-guerra-mundial/>.Acesso
em: 10 de maio de 2018.
[3] Estado Novo (Brasil). Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Estado_Novo_(Brasil))>.
Acesso em: 10 de maio de 2018.
[4] http://pt.wikipedia.org/wiki/Estado_Novo_(Brasil)
[5]
OLIVEIRA, Rodrigo. A Intentona Comunista de 1935. Disponível em: <http://nadaalemdeverdades.blogspot.com.br/2013/11/a-intentona-comunista-de-1935.html>.
Acesso em: 10 de maio de 2018.
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