7º Texto – Entendendo o Sistema Feudal
Visando facilitar o estudo acerca do Sistema Feudal, o presente
texto está dividido em perguntas e respostas. Através do uso de obras que
abordem o tema, buscaremos entender os elementos que configuraram o Sistema
Feudal. Vamos começar!
1) Uma definição básica sobre Sistema Feudal.
Jacques Le Goff (1924 - 2014) define como um sistema de
organização econômica, social e política, baseado nos vínculos de homem a
homem, no qual uma classe de guerreiros especializados – os senhores -,
subordinados uns aos outros por uma hierarquia de vínculos de dependência,
domina uma massa campesina que explora a terra e lhes fornece com que viver[2].
logo mais explicaremos essas teias que envolviam a sociedade
medieval.
2) Mas o que isso significa?
Para entendermos melhor o que foi dito, vamos partir da ideia de
que a formação do Sistema Feudal (ou Feudalismo) veio de um longo processo,
marcado por inúmeros acontecimentos, como vimos nos últimos textos lidos.
Assim, a Idade Média corresponde ao período do Sistema Feudal,
indo do século V d.C. (mais precisamente 476 d.C., quando ocorre a queda do
Império Romano do Ocidente) até o século XV (mais precisamente 1453 d.C.,
quando ocorre a queda do Império Bizantino, ou Império Romano do Oriente).
Portanto, compreende um período aproximado de mil anos.
Devido à grande abrangência, tornou-se comum dividir a Idade Média
em períodos. Dividi-la-emos em dois períodos: 1º - Alta Idade Média, entre os
séculos V e XII; 2º - Baixa Idade Média, entre os séculos XII e XV.
A princípio, conheceremos melhor a chamada Alta Idade Média.
A Alta Idade Média
É estranho começar um texto com um pedido de desculpas, mas, nesse
caso, ele é realmente necessário. Vamos utilizar a ideia de que Idade Média
tenha correlação direta com Sistema Feudal, mas não é bem isso que ocorreu. O
Sistema Feudal só esteve realmente presente entre os séculos X e XIII. E,
mesmo nesse momento, chega a ser complexo (quiçá errôneo) dar uma única
definição à ideia de feudo. Assim, Rezende Filho disserta que “o feudo,
longe de ser homogêneo para todas as áreas territoriais, é extremamente
particular e diferenciado”[3].
Portanto, os modelos que utilizaremos são gerais, mas, fique
tranquilx, extremamente cuidadosos.
Cada pequeno território ficou sob o domínio de um guerreiro, um
senhor. Em especial os germanos logo consolidaram uma política baseada nos
guerreiros e nas invasões. Assim, a figura do guerreiro passou a ser associado
à figura do nobre, senhor de um determinado pedaço de terra.
A ruralização, fruto dos constantes ataques às cidades, levou a
população a morar no campo, próxima as fortificações, que, na maioria das
vezes, eram pequenos castelos. Os castelos começaram a se tornar pequenos
reinos, com extensões variáveis de terra[4],
protegidos por muralhas e fossos. No interior e ao redor dessas muralhas viviam
e trabalhavam diversas pessoas, prestando serviços ao senhor dessas terras em
troca de proteção e de um local para viver. O feudo era baseado, resumidamente,
na seguinte estrutura: o senhor feudal e os servos, ou seja, as
pessoas que trabalhavam para o senhor feudal.
Uma das principais formas de se definir o Sistema Feudal é através
das relações servis de produção (servidão medieval). Significa o seguinte:
o senhor feudal é “proprietário” da terra[5],
e o servo é quem trabalha nestas terras, através de uma série de obrigações
(chamadas de obrigações servis), devendo cumpri-las integralmente. Também o
senhor feudal possuía deveres para com seu servo. O brilhante pensador Leo
Huberman (1903 – 1968) pontua que as obrigações que os servos tinham para com
os senhores, e as que o senhor devia ao servo – por exemplo, proteção em caso
de guerra – eram todas estabelecidas e praticadas de acordo com o costume.
Poderíamos dizer que os costumes medievais tinham função parecida com as leis
de hoje![6].
Analisemos agora com mais
cuidado essas relações presentes na sociedade medieval. Abaixo,
imagem de dois senhores feudais realizando a prática da caça com falcão (ou
falcoaria), costume vindo do Oriente.
Voltando à ideia das obrigações servis que o servo
deveria cumprir, vejamos algumas:
a) Talha: os servos tinham que entregar ao senhor feudal uma parte
de sua produção agrícola;
b) Corveia: obrigados a trabalhar gratuitamente nas terras do
senhor, não podendo se deslocar do feudo sem permissão;
c) Mão-morta: imposto pago quando um servo sucedia a seu pai na
posse do lote arrendado;
d) Banalidades: pagar pelo uso de instrumentos que existiam dentro
do feudo, tais como fornos e moinhos.
Tais obrigações remontam às heranças trazidas pelo mundo romano,
mas com claras e evidentes interferências dos povos bárbaros. É impossível
separar conceitos romanos e bárbaros nessa sociedade que se constituiu após o
fim do Império Romano do Ocidente.
É fundamental deixar claro que os senhores feudais também possuíam
diversas obrigações para com os seus servos, como proteção em caso de guerra,
por exemplo. E entre senhores feudais as obrigações e vínculos eram muitos e
fundamentais para a manutenção da sociedade. E esses vínculos
moldaram toda a estrutura social da Europa do período. “Entre os
guerreiros-proprietários, estabelece-se logo, uma clara distinção do cunho
sócio militar: os aristocratas, grandes proprietários, verdadeiros chefes
regionais; os médios proprietários, comandantes locais; e os simples
proprietários, meros guerreiros”[7].
As teias dessas relações eram os vínculos de dependência entre os
senhores feudais, chamados de suserania e vassalagem (ou vassalagem de
benefício).
Para explicar, pensemos em
uma Europa dividida em inúmeros feudos, usando como exemplo uma grande colcha
de retalhos, com diversas cores e tamanhos. As linhas da colcha,
costurando os mais diversos pedaços, eram as relações e instituições, evitando
também conflitos intermináveis[8], dentre as quais as relações de suserania e vassalagem.
O que seria isso? Veja os esquemas abaixo:
Antes de seguirmos, façamos algumas importantes ressalvas.
1ª - as relações de Suserania e Vassalagem só ocorriam entre os
senhores feudais, ou seja, entre os nobres!
2ª - o vassalo, ao receber o feudo, deveria proteger e ajudar
financeiramente seu suserano, ajuda essa estabelecida pelo juramento de
fidelidade (Investidura).
3ª - a instituição
que unia esses feudos e os senhores feudais era a IGREJA CRISTÃ (definida, a
partir do século XI como Igreja Católica Apostólica Romana), a mais importante
instituição do período. Era ela quem estava representada em todos os feudos e a
ela os senhores feudais prestavam serviços. Vamos analisá-la cuidadosamente,
mas podemos ter uma ideia de seu poder a partir de uma frase do historiador
Alfredo Boulos Júnior.
3) O papel da Igreja na Idade Média.
O clero era formado pelo papa, cardeais, bispos, abades, monges e
padres. A maioria desses religiosos tinha origem nobre e possuía feudos, muitos
deles enormes. Cerca de dois terços das terras da Europa Ocidental pertenciam à
Igreja, num tempo em que a terra era a principal medida de riqueza. A Igreja
Católica era, portanto, a instituição mais rica da sociedade feudal[9].
Na simpática imagem ao lado você pode observar um dos rituais que
marcavam as relações de suserania e vassalagem. O vassalo recebe um objeto de
seu suserano (o benefício), comprometendo-se, a partir de então, cumprir uma
série de obrigações. Essa era uma das etapas da investidura. Muitas vezes, ao
invés de objetos, o suserano poderia entregar um punhado de terra ou
folhas.
Além do mais
Uma importante distinção que deve ser feita acerca da sociedade
medieval é de que nela, ao contrário da sociedade romana, não foi a escravidão
que predominou, mas sim a servidão. E servidão e escravidão não é a
mesma coisa!
Ainda não detalharemos a vida do servo, mas façamos uma breve
análise.
Inseridos em uma sociedade rural e estamental, os servos viviam
para sustentar a ordem feudal, trabalhando em terras que pertenciam aos senhores
feudais, em uma espécie de “parceria”, recebendo em troca proteção e a
possibilidade de alimentar e manter sua família.
Cabe a pergunta: seria a servidão medieval uma espécie de
escravidão? Não podemos afirmar isso, pois há diferenças significativas que nos
impedem de classificar a servidão como escravidão. Primeiramente, podemos
definir que o escravo é uma mercadoria dentro do regime escravista, o que faz
com que o indivíduo escravizado tenha todas as suas vontades e interesses
determinados e controlados pelo senhor. A escravidão elimina a “liberdade”,
fazendo com que o escravo passe a ser um objeto, uma mercadoria. Já na
servidão, o senhor feudal não é proprietário de seu servo, não podendo vendê-lo
ou comprá-lo. A liberdade do indivíduo, sem dúvida, estava ligada a sua vida no
feudo, mas não pela propriedade determinada pelo senhor feudal[10] e
sim pela dificuldade que o servo encontraria em viver fora do feudo.
O regime escravista trata o ser humano como uma simples
mercadoria, produtora de tantas outras. A servidão tem o ser humano como peça
fundamental na produção das mercadorias, porém não sendo o homem uma
mercadoria. Vale lembrar que na Idade Média tivemos a servidão em maior escala
e, em alguns grandes reinos, a escravidão. Porém, a Idade Média foi
caracterizada pela servidão.
Exercícios de revisão
1) Resumidamente, explique as relações de Suserania e Vassalagem
2) É possível afirmar que as relações de Suserania e Vassalagem auxiliavam na manutenção do Sistema Feudal? Explique sua resposta.
[2] LE GOFF, Jacques. A civilização do Ocidente Medieval. Vol. II - Lisboa: Estampa, 1984, p. 29 (adaptado)
[3] Rezende Filho,
Cyro de Barros. Guerra e guerreiros na Idade Média/ Cyro de Barros Rezende
Filho. – São Paulo; Contexto, 1996. (Coleção repensando a história geral). p.
56.
[4] um senhor com mais poder possuiria mais terras – aliás, a terra era a principal medida de riqueza na época. Ter terra significava ter poder. Rezende Filho apresenta a ideia de que a liberdade não estava vinculada apenas a ideia de não ser escravo. Era fundamental ter propriedade. E, atrelado a isso, ser um chefe guerreiro.
[5] Insisto aqui que a ideia de propriedade precisa e será mais bem explicada à frente.
[6] PAZZINATO, A L.; SENISE, M. H. V. - História Moderna e
Contemporânea. 6a. Edição. - São Paulo: Editora Ática, 1997. p. 7.
[7] Rezende Filho, Cyro de Barros. Guerra e guerreiros na Idade
Média/ Cyro de Barros Rezende Filho. – São Paulo; Contexto, 1996. (Coleção
repensando a história geral). p. 32.
[8] Já pensou na quantidade de conflitos que um senhor feudal estaria envolvido para proteger suas terras de outros feudos?
[9] Huberman,
Leo. História da riqueza do homem/ Leo Huberman; tradução de Waltensir Dutra. –
21ª. ed. – Rio de Janeiro: Guanabara, 1986. p.9 (adaptado).
[10] até porque essa não existia
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