2º Texto-base: a expedição de Martim Afonso de Sousa e as bases econômicas da colonização[i]
A expedição que viria colonizar o Brasil foi organizada sob e com a
interferência do rei português D. João III, que passou a ser conhecido como O
Colonizador, buscando, portanto, ocupar as terras oficialmente. Foi comandada
por Martim Afonso de Sousa e contava com cinco embarcações – um galeão, duas
caravelas e duas naus – e mais de 400 pessoas à bordo.
Durante a viagem ao Brasil, os portugueses combateram e capturaram
alguns navios franceses em águas brasileiras, bem como exploraram o rio da
Prata, no sul do continente americano. Sabemos que a exploração desse rio foi
um dos principais motivos da viagem de Martim Afonso de Sousa, já que se
acreditava ser o Prata um dos caminhos para as regiões ricas em metais
preciosos da América andina. Cerca de um ano depois de sua partida de Portugal,
Martim Afonso de Sousa fundou, em janeiro de 1532, a vila de São Vicente, o
primeiro núcleo efetivo dos portugueses no Brasil.
Martim Afonso chegou à colônia com poderes judiciais sobre os demais
homens que auxiliariam na colonização, bem como sobre os nativos e portugueses
que habitavam o Brasil. Também ficou sob sua responsabilidade a missão de criar
cargos judiciários e administrativos, necessários para o processo de
colonização, e iniciar a distribuição de terras entre os colonizadores.
Ao redor da vila fundada por Martim Afonso de Sousa foram se organizando
os primeiros engenhos de açúcar – base econômica do início da colonização. É
importante enfatizarmos que os engenhos portugueses foram em grande parte
construídos graças ao capital holandês. A cana-de-açúcar também foi
introduzida no Brasil por Martim Afonso de Sousa, dono do primeiro engenho
erguido na colônia, e auxiliado pelo capital do holandês Johann van Hielst –
conhecido pelos portugueses como João Vaniste.
Há uma explicação para a interferência e participação dos holandeses,
principalmente no início da colonização. Portugal enfrentou significativos
problemas ao iniciar a colonização, sendo que um dos maiores remetia à falta de
capital (dinheiro) para colocar em prática o projeto colonizador. É nesse ponto
que temos a participação dos holandeses, em sua maioria banqueiros e mercadores
que, havia tempos, estavam associados com os portugueses, e passaram a
financiar as construções dos engenhos e de outras inúmeras atividades
econômicas da colônia.
Representação de um engenho de açúcar do período colonial. Dê uma olhada na evidente relação com o trabalho escravo.
Vários fatores justificam a escolha da cana-de-açúcar como mercadoria a
ser produzida na colônia. Portugal já havia iniciado a produção de açúcar,
através do cultivo da cana-de-açúcar, antes do descobrimento do Brasil. O
açúcar português era produzido nas ilhas de Madeira, Açores e
Cabo Verde.
Portanto, não se tratava de uma atividade agrícola e comercial
desconhecida. Atrelado a isso está o fato de que o açúcar se tratava
de uma especiaria, “dono” de um mercado em expansão na Europa. Mas
um dos fatores mais determinantes foi a semelhança entre os climas e condições
ecológicas das ilhas atlânticas e do Brasil, principalmente do nordeste
brasileiro, muito favoráveis ao plantio de cana-de-açúcar.
A fundação dos engenhos de açúcar tinha como objetivo povoar a colônia e
assegurar a posse para os portugueses. Os engenhos se encaixavam no sistema
econômico das plantations, ou seja,
extensas plantações de um determinado gênero agrícola – no caso, a
cana-de-açúcar –, produzindo mercadorias que fossem exportadas para o mercado
europeu. Em decorrência desse sistema, as plantations[ii] faziam
com que em todas áreas onde fossem implantadas, a policultura se tornasse atividade
de caráter secundário e extremamente restrito.
A pecuária nordestina foi importante como atividade secundária. De
grande importância na produção e manutenção do sistema açucareiro, na medida em
que o gado criado em áreas próximas às plantações de cana-de-açúcar e aos
engenhos era utilizado como força motriz para movimentar as moendas, meio de
transporte para levar cargas e trabalhadores, vestuário – com a utilização do
couro do animal – e fonte de alimento. A interiorização da pecuária se tornou
um processo de singular importância na ocupação de novas terras pelos
portugueses, como veremos.
Podemos resumir o sistema de plantations
da seguinte maneira: uma grande propriedade agrícola, trabalhada em sua imensa
maioria por escravos, com tendência a autossuficiência, cuja produção se
voltava quase que exclusivamente para o mercado externo.
As capitanias hereditárias
Para efetivamente colonizar a grande extensão colonial, a monarquia
portuguesa escolheu o sistema de Capitanias Hereditárias, que já havia sido
utilizado, com relativo sucesso, em algumas outras áreas coloniais de Portugal.
A chegada de Martim Afonso de Sousa oficializou o início da montagem do sistema
colonial, fazendo com que as terras fossem divididas em 15 lotes, doados a 12
capitães donatários (portanto, houve casos de donatários que receberam mais do
que um lote). Esses capitães assumiriam a responsabilidade – quase que em todas
as esferas – de fazer com que a colonização de seus lotes ocorresse e que esses
se tornassem rentáveis do ponto de vista mercantil. Os cargos de donatários
eram vitalícios e hereditários. Voltaremos a falar dos capitães donatários.
O processo de ocupação de um lote era, de fato, oneroso e complicado.
Buscando “convencer” os donatários a assumirem suas Capitanias, a Coroa
Portuguesa criou uma série de vantagens, dentre as quais o fato dos donatários
terem o direito de escravizar as populações indígenas, desde que enviassem à
Coroa Portuguesa uma parte da renda conseguida nesse comércio, bem como alguns
escravos indígenas. Os donatários poderiam doar sesmarias - lotes de terras - a
quem se interessasse em cultivá-los. No entanto, a doação só poderia ser feita
aos cristãos portugueses. A distribuição de terras ficava sob a
responsabilidade do donatário, o que não quer dizer que o mesmo fosse
proprietário das terras. Todas as terras das Capitanias Hereditárias pertenciam
ao rei português. Os donatários atuariam como administradores das terras reais.
A princípio, a Coroa Portuguesa havia “convidado” membros da alta
nobreza para se tornarem donatários na nova missão colonizadora em que Portugal
embarcara. O desinteresse foi tanto, que a Coroa Portuguesa fez dos militares e
navegadores ligados ao comércio oriental alguns dos seus capitães donatários. O
maior ônus para os capitães donatários estava no fato de que grande parte da
colonização se daria por investimentos próprios, e a grande maioria desses
homens não possuía capital suficiente para tocar um projeto de tal envergadura.
Muitos donatários – inclusive o donatário Martim Afonso de Sousa -, no
intuito de iniciar a colonização de seus lotes, buscaram fazer empréstimos de
banqueiros e negociantes – principalmente judeus - de Portugal e da Holanda.
Mesmo assim, uma significativa parcela desses homens nunca chegou a pisar na
colônia. Um dos maiores receios estava no fato de que o dinheiro aplicado nos
lotes não gerasse o devido retorno. E dos que chegaram a iniciar a colonização
dos lotes recebidos, poucos foram os que obtiveram sucesso. O fracasso vinha
por diversos motivos: terras inóspitas, índios hostis, distância entre as
capitanias, dificuldade em defender as vilas etc.
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