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quinta-feira, 23 de julho de 2020

2ª SD de Revisão dos sétimos anos - A Guerra dos Cem Anos

A Guerra dos Cem Anos [1]

Afirmamos que a formação dos Estados Nacionais foi um dos elementos mais marcantes da Baixa Idade Média. A crise do feudalismo foi agravada por conflitos locais e, após a formação das nações, por conflitos nacionais. E foram as guerras entre a França e a Inglaterra, conhecidas como Guerra dos Cem Anos (1337 – 1453), que tornaram a Europa Medieval palco de uma série de eventos que facilitaram o fim do Sistema Feudal.

Consideramos que os conflitos entre franceses e ingleses ocorreram em grande parte por iniciativa militar inglesa e estiveram exclusivamente ligados ao território francês (palco das disputas militares e políticas). A Inglaterra, momentos antes de iniciar os conflitos, apresentava vantagens em relação à nação francesa. “Com a cobrança de impostos já regulamentada, os exércitos ingleses puderam ser adequadamente formados"[2]. Na realidade, não tivemos cem anos de conflitos. Períodos de guerras eram muitas vezes entremeados[3] por períodos de paz e armistícios[4].

Mas, afinal, por que a Guerra dos Cem Anos começou? Existem várias explicações, entre elas problemas de sucessão (quem iria substituir um rei morto?), as antigas disputas territoriais (afinal, aquela terra é de quem?) e as divergências[5] políticas. Dois itens foram marcas gerais dos conflitos:

“- A disputa entre os monarcas dos dois países pela região de Flandres, que era uma rica região comercial e grande produtora de manufaturas têxteis cuja matéria prima, a lã, era importada da Inglaterra[6];

A sucessão do trono francês. Com a morte do rei Carlos IV, em 1328, a dinastia dos capetíngios terminou, pois ele não havia deixado descendentes diretos. Apresentaram-se como candidatos Filipe de Valois, sobrinho do ex-rei Filipe, o Belo (1285 – 1314) da dinastia dos capetíngios; e Eduardo III, rei da Inglaterra, neto por parte de mãe de Filipe, o Belo. A nobreza francesa coroou Filipe de Valois (Filipe IV), baseando-se em uma lei medieval (a lei Sálica) que impedia qualquer descendência real através da mulher[7]

A região de Flandres.

Obviamente que Eduardo III não concordou com a coroação de Filipe IV, recorrendo às armas. A nobreza da França era contrária à coroação de Eduardo III, justamente porque, caso este chegasse ao trono francês, a Inglaterra dominaria a rica região de Flandres. Começava a Guerra dos Cem Anos.

Dividimos a guerra em quatro fases distintas. Observe que o conflito muda conforme as “fases”:

1ª. Fase (1337-1360): marcada por vitórias inglesas. A Inglaterra controlou quase toda a faixa litorânea noroeste da França;

2ª. Fase (1360-1380): foi uma fase de recuperação da França, que reconquistou boa parte dos territórios ocupados pelos franceses;

3ª. Fase (1380-1420): novamente a França sofre uma série de derrotas. A figura de Henrique V, rei inglês, se destaca. Nesse momento o rei inglês chegou a ser considerado herdeiro do trono francês;

4ª. Fase (1420-1453): foi o momento em que ocorreu a lenta recuperação francesa. Tivemos a presença da francesa Joana D’Arc, que com um discurso nacionalista liderou um exército popular contra os ingleses. Joana foi derrotada na região de Borgonha, sendo então entregue as tropas inglesas. Foi morta na fogueira. No entanto, foi essa francesa quem liderou a França rumo à vitória. Os ingleses foram finalmente expulsos do território francês em 1453.

A vitória francesa ainda não estava consolidada em 1453. A nobreza de Borgonha (região francesa) impôs a paz ao rei francês, Carlos VII, buscando impedir que o soberano controlasse os nobres. No entanto, o rei Luis XI (1461-1483), percebendo a manobra da nobreza, consolidou o poder do rei e finalmente confirmou a monarquia francesa.

Se forem observados os resultados dos conflitos para ambas as nações podemos encontrar situações diferentes (quase opostas). Comecemos pela Inglaterra.

Os historiadores consideram que a reorganização econômica e militar francesas (a partir do governo de Carlos VII) dificultaram a presença dos ingleses em território inimigo, levando finalmente a derrota da Inglaterra. “A derrota na Guerra dos Cem Anos coincidiu com o fim da dinastia reinante na Inglaterra e com o aumento de rivalidades entre os nobres. A autoridade real não era mais capaz de manter essa camada unida. Dois anos depois eclodiu uma guerra civil, conhecida como Guerra das Duas Rosas (1455-1485), entre as duas maiores famílias proprietárias de terras – os York e Lancaster. Após trinta anos de lutas, ascenderam ao trono os Tudor, responsáveis pele efetiva centralização na Inglaterra”[8]

Como dito, os resultados franceses foram bem diferentes. Apesar de vitimar um grande número de trabalhadores e causar prejuízos materiais, o conflito permitiu a confirmação do poder da dinastia Valois sobre a nobreza feudal, com a ajuda e o apoio do exército nacional. O processo de consolidação da monarquia francesa foi concluído no reinado de Francisco I (1515-1547).

Conclui-se assim que devido ao longo “período de guerras, da peste negra e das inúmeras revoltas camponesas, a situação da Europa agravou-se, indicando o esgotamento do sistema feudal. Além disso, as guerras entre a França e Inglaterra produziram um forte sentimento de nacionalidade que, de certa forma, ameaçaram os interesses e o poder da nobreza, uma vez que ela teria de reconhecer uma autoridade central representando a nação, ou seja, o rei”[9]



[1] professor Pedro Henrique Ramos

[2] Pazzinato, A. L.; Senise, M. H. V. – História Moderna e Contemporânea – São Paulo: Ática, 1997. p. 22

[3] alternado, entre os períodos de guerra existiram períodos de paz

[4] pode ser definido como a ocasião em que as partes envolvidas no conflito concordam com o fim definitivo das hostilidades – o que inclui os ataques. Pode ser definido também como o momento anterior ao tratado de paz. A palavra deriva do latim: arma (arma) e stitium (parar).

[5] diferenças, discordância em relação a algum ponto ou assunto.

[6] sim, se você está pensando que a burguesia teve um dedinho de responsabilidade nessa história, está correto! Há quem diga que a Inglaterra foi a guerra por pressão da burguesia inglesa, interessada em tomar conta de Flandres

[7] Moraes, J. G. V. Caminhos das Civilizações – São Paulo: Atual, 1993. p. 129.

[8] Pazzinato, A. L.; Senise, M. H. V. – História Moderna e Contemporânea – São Paulo: Ática, 1997. p. 22

[9] Moraes, J. G. V. Caminhos das Civilizações – São Paulo: Atual, 1993. p. 129


domingo, 19 de julho de 2020

2ª SD de Revisão - Os seres humanos na América

Os seres humanos na América[1]

Quando os europeus chegaram à América, entre os séculos X e XII, com as expedições Viking, ou mesmo com as primeiras viagens de caravela, no final do século XV, os índios habitavam grande parte da América. Assim, podemos nos perguntar: como as populações indígenas chegaram ao Continente Americano? Também chegaram à América em caravelas?

Os hominídeos, durante o processo evolutivo, passaram a habitar os mais variados continentes. Originários da África, a espécie humana, através das conquistas evolutivas, tornou-se cosmopolita, ou seja, habitante dos mais variados continentes. A América foi mais uma das etapas dessa expansão dos hominídeos pelo globo terrestre.

Com um trecho do mar de Bering (entre o nordeste asiático e noroeste americano) congelado, os hominídeos poderiam chegar ao continente americano. A ideia de travessias oceânicas, como as que foram feitas pelos portugueses, são dadas como improváveis na pré-história. Se há quinhentos anos fazer essa viagem era complicado (um terço dos viajantes morria, segundo dados, às vezes até mais), imagine há 30 mil, 20 mil anos... Portanto, a teoria de que os primeiros habitantes da América chegaram aqui em embarcações, depois de atravessar grandes extensões de água, possui postos difíceis de serem defendidos.

Começando a concluir

A espécie que passou a habitar o continente americano foi o Homo sapiens sapiens, ou seja, a espécie atual. Os homens que aqui chegaram seriam provavelmente caçadores nômades, ou seja, encaixaríamos o início da migração para o continente americano no período Paleolítico. A primeira incursão à América ocorreu, segundo os especialistas, pela região norte, por volta de trinta mil anos. E é certo que há cerca de treze mil anos a América do Sul  (onde se localiza o Brasil) já era povoada, sendo que esses primeiros “sul-americanos” se alimentavam de animais da chamada megafauna, como a preguiça gigante.

O que fundamenta que o “Caminho de Bering” fosse uma via utilizada é a análise conjunta das GLACIAÇÕES. Isso mesmo glaciações! Podemos considerar as glaciações como fases em que as temperaturas médias de nosso planeta estão consideravelmente mais baixas, “provocando nas altas latitudes continentais a acumulação de grandes geleiras, e nas zonas tropicais o aumento das chuvas"[ii]. O real motivo para a ocorrência dessas glaciações ainda é, de certo modo, desconhecido. Os pesquisadores consideram que o nosso planeta já passou por quatro glaciações.

Um dos vestígios mais claros dessa primeira aventura humana pelo continente americano são as pinturas rupestres. E é sobre ela que trataremos agora.


As pinturas rupestres

Importantes registros da pré-História humana! Valiosos documentos da jornada do homem pelos quatro cantos do globo terrestre.

Nas paredes das cavernas desenhavam os antigos hominídeos. Retratavam muitas coisas, se haviam caçado, se estavam em festa, se corriam perigo. Foi uma das primeiras formas de manifestação cultural, indicando que os seres humanos passavam a estabelecer vínculos sociais fundamentais.

Rupestre significa aquilo que é gravado na pedra. E o que na pedra ficou para a História entrou. As primeiras pinturas teriam entre cem mil e quarenta mil anos. Homens de Neanderthal, bem como indivíduos da espécie Homo sapiens, já pintavam. 

As tintas eram feitas a partir da trituração de cascas de fruta e sementes, misturadas com sangue de animal, urina e fezes Aí era usar os dedinhos e soltar a imaginação. Às vezes era usado um pincel bem rudimentar.

Para enxergar o que faziam, as pessoas acendiam uma fogueira no interior da caverna e começavam a desenhar. Havia vários tipos de desenho: desde cenas do cotidiano, como caçadas, até desenhos bem peculiares.

O Brasil possui o local com a maior quantidade de pinturas rupestres! São milhares de desenhos no Parque Nacional Serra da Capivara (imagem), no Piauí. Há desenhos de muitas cores, formas e representações. Alguns no teto das cavernas, a dez metros de altura. Também há pinturas rupestres presentes nas cavernas do Vale do Peruaçu (Minas Gerais), na Chapada Diamantina (Bahia), no município de Iguape (São Paulo) e em outra porção de lugares.



[1] professor Pedro Henrique Ramos

[ii] Cardoso, Ciro Flamarion S. América pré-colombiana – São Paulo: Brasiliense, 2004. p. 17

 



segunda-feira, 6 de julho de 2020

1ª SD de Revisão: a Baixa Idade Média

A Baixa Idade Média[1]

 

Muitos foram os fatos que mostraram que a Baixa Idade Média já apresentava características muito diferentes da Alta Idade Média. Se tivéssemos uma máquina do tempo e pudéssemos visitar o século VII, na Alta Idade Média, e depois o século XIV, já na Baixa Idade Média, voltaríamos com a certeza de que a sociedade não era a mesma, isso é fato. Nos cabe agora comprovar essa afirmação.   

Conforme visto no texto passado, a produção agrícola aumentou de maneira significativa entre os séculos X e XI. E muitos fatores contribuíram para que isso ocorresse. Vale lembrar que a produção agrícola, em algumas áreas da Europa Medieval, obedecia a um sistema conhecido por bienal. Isso significa dizer que a terra era dividida em dois lotes, sendo que um produzia e outro ficava em descanso (em pousio[2]). Assim, a área em descanso voltava a ser fértil. O problema era que se em um ano as áreas com cultivo fossem atingidas por geadas, certamente as populações passariam fome. Além do fato de se produzir menos, já que 50% das terras estavam em descanso.

  Porém, a partir do século VIII, algumas áreas centrais da Europa começaram a utilizar o sistema trienal. A terra agora era dividida em três lotes. Isso, segundo o historiador Charles Parain, pode ser compreendido “como a maior inovação agrícola da Idade Média[3]. E ele tem motivos de sobra para afirmar isso. Acompanhe a tabela abaixo:

Sistema Trienal

Campo A

Campo B

Campo C

Ano 1

Trigo e centeio

Descanso (pousio)

Aveia

Ano 2

Aveia

Trigo e centeio

Descanso (pousio)

Ano 3

Descanso (pousio)

Aveia

Trigo e centeio

Com o sistema trienal apenas 1/3 da terra ficava sem produzir, o que aumentou a produção em cerca de 30%, se compararmos com o sistema bienal. O aumento na produção dos alimentos levou a uma queda nas taxas de mortalidade, decorrentes de surtos de fome, comuns na Alta Idade Média, além de levar à produção do excedente, que começou a ser comercializado nas feiras e villas.

Outro fator recentemente apresentado pelos historiadores, com o auxílio de outros cientistas, foi o fato de que os invernos a partir do século XI começaram a se tornar menos rigorosos, o que fez com que as plantações não sofressem tanto com as geadas e as pessoas não morressem de frio. Com o aumento da população, muitas áreas tornaram-se campos cultiváveis. Não seria exagero pensar que a figura do camponês derrubando árvores para iniciar o plantio em um campo fosse a imagem mais comum do início da Baixa Idade Média.


Tais eventos, no entanto, auxiliaram a ocorrência das crises medievais. Sem os mesmos, muito provavelmente as crises não teriam ocorrido com tamanha intensidade. 

As crises...

O aumento populacional levou a um problema simples: o esgotamento dos feudos. Muitos eram os camponeses marginalizados. Marginalizados literalmente, já que viviam às margens dos feudos. Muitos começavam a roubar para poder sobreviver. Outros, como vimos, viviam dos excedentes, revendendo-os nos burgos e feiras. Estes deram origem aos comerciantes. Aliás, a cidade passou a assumir o sinônimo de liberdade. Por isso, Leo Huberman escreveu o seguinte em seu livro “A história da riqueza do homem”: “A população das cidades queria liberdade. Queria ir e vir quando lhe aprouvesse. Um velho provérbio alemão, aplicável a toda a Europa Ocidental, ‘o ar da cidade torna um homem livre’[4]. Huberman conclui seu raciocínio com uma brincadeira. “Se Lorris e as demais cidades possuíssem a técnica de anúncios de beira de estrada do século XX, poderiam ter usado um letreiro como este:”[5]   

Assim, fica claro que as cidades começaram a colocar em dúvida a figura do feudo e da servidão medieval. Muitos senhores feudais, a princípio, não notaram a influência que os burgos teriam sobre o fim da economia medieval. Só a partir do século XIV isso ficou muito nítido. E daí para a instauração de novas taxas, novos impostos, foi um pulo. Cientes da riqueza dos burgos e buscando manter os seus privilégios, muitos senhores feudais passaram a criar novas obrigações. Alguns reinos, como veremos a seguir, buscando manter o exército e os privilégios da nobreza, aumentaram seus impostos e instituíram outros tantos. Muitas revoltas camponesas começaram a ocorrer. Nessas revoltas, ficava claro que os camponeses já enxergavam a sociedade de uma forma diferente, e as cidades contribuíram muito para isso.  

E quanto aos camponeses marginalizados, como se livrar desse “problema”? O papa Urbano II dava uma solução prática ao problema: enviar alguns camponeses para lutar nas Cruzadas. Assim, várias situações eram resolvidas: um “exército” era formado praticamente sem custo algum; novas áreas poderiam ser conquistadas, ajudando a resolver o problema da nobreza despossuída, além de impedir que uma massa de camponeses marginalizados tivesse tempo para roubar ou mesmo iniciar uma revolta.

As Cruzadas também auxiliaram na ocorrência das crises da Baixa Idade Média. Com elas, novas rotas comerciais foram abertas. No lugar da economia medieval, assumia a economia com forte apelo comercial, uma economia que daria origem ao capitalismo.

As crises epidêmicas

As crises epidêmicas pelas quais a humanidade já passou tornam-se fatos históricos de tamanha importância que muitos são os filmes, livros e imagens que registram o assunto. Elas mudam a forma como as pessoas encaram a sociedade, a vida. Vamos lembrar um caso próximo: a gripe relacionada ao vírus H1N1 (popularmente conhecida como gripe suína). Originada no México, ela fez com que a capital daquele país ficasse com as ruas vazias no período de surto[6] da doença. Isso porque as pessoas ficaram com medo de contrair a doença.

Aqui no Brasil, aulas foram suspensas, o álcool em gel ficou bem conhecido, além de a gente relembrar que, na hora de expirar, a mãozinha deve cobrir o nariz...

Na Idade Média muitas foram as crises epidêmicas e algumas vezes as doenças assumiram o (triste) papel de segregação[7] social. Trataremos deste assunto a partir de agora, lembrando que estamos falando de vidas, portanto, algo bastante sério.

Muitos livros de História dão conta de que os surtos de peste foram trazidos do Oriente, com as Cruzadas. Mas vale lembrar que antes das Cruzadas, bem antes, a Europa Medieval era assolada por crises epidêmicas. É fato, no entanto, que o maior surto se iniciou entre os séculos XII e XIV, se estendendo por muitos anos. A forma mais comumente conhecida foi a peste bubônica. A peste bubônica ficou popularmente conhecida como peste negra. Cerca de um terço da população da Europa morreu em virtude dessa doença. Para você ter uma simples ideia, é como se de três pessoas que viviam na época uma tivesse contraído a peste e morrido. No período, todas as explicações partiam da questão religiosa. Assim, Boccacio (citado no início desse texto), buscou justificar a ocorrência da peste como “um justo castigo divino”. E não só ele, mas muitas outras pessoas que viveram no período.

Hoje sabemos que a peste é transmitida pelas pulgas que se alimentam do sangue dos ratos e depois se alimentam do nosso. Elas transmitem uma bactéria que só foi descoberta bem no final do século XIX e recebeu o nome de Yersinia pestis. Muito mais forte do que os soldados medievais, a Yersinia não fazia distinção entre camponeses, senhores feudais e padres. Matou muitas, muitas, pessoas. Como os hábitos de higiene não eram muito comuns (na verdade, não eram praticados), as pessoas constantemente carregavam pulgas nas roupas. Assim, uma passava para a outra e, em poucos dias, o camponês, o senhor feudal, o padre apresentavam um quadro febril, seguido de um inchaço nas juntas (os bulbos), marcado por uma cor rubra (um vermelho bem escuro), indicando a necrose, ou seja, o apodrecimento dos tecidos, vasos sanguíneos e carne. Era a peste se manifestando dias após a picada da pulga.

Mas não foi só a peste bubônica que matou na Idade Média. Tivemos a peste pneumônica, muito pior inclusive. A peste pneumônica, acreditam os cientistas, seria decorrente da bubônica, só que transmitida por gotas de saliva. Se a bubônica era transmitida pela picada da pulga, bastava um doente tossir próximo a alguém sem cobrir a boca que a pneumônica se espalhava. E a doença se manifestava com uma força maior.

Havia outra doença que isolava pessoas e matava na Idade Média: a Hanseníase, popularmente conhecida como lepra. A doença “é infecciosa, de evolução crônica (muito longa) causada pelo Mycobacterium leprae, micro-organismo que acomete principalmente a pele e os nervos das extremidades do corpo. A doença tem um passado triste, de discriminação e isolamento dos doentes, que hoje já não existe e nem é necessário, pois a doença pode ser tratada e curada[8]. Mas, na Idade Média, as pessoas com hanseníase viviam isoladas da sociedade. Eram criados locais onde muitas delas passavam a viver, chamados de leprosários ou gafarias. Quem possuísse a doença deveria andar com objetos de metal pendurados pelo corpo, indicando que estava se aproximando. Talvez este seja o traço mais cruel das doenças na Idade Média: a segregação social.

Com as crises epidêmicas, a morte passou a ser representada com maior ênfase na Idade Média. Muitos foram os registros da doença. A religião também se manifestava na forma como as pessoas entendiam as doenças. Sem os equipamentos e o conhecimento que possuímos, as explicações eram praticamente todas pautadas nos princípios religiosos.

Além do mais

Com a morte de muitos camponeses, várias foram as regiões da Europa que ficaram sem produzir absolutamente nada. Sem alimento a situação ficava cada vez pior. Só para termos uma ideia, muitas foram as regiões que quase viram pequenos reinos e feudos desparecerem porque não havia gente para trabalhar. Morreu muita gente mesmo. Há um documento histórico que confirma isso: “A fim de que meus escritos não pereçam[9] juntamente com o autor, e este trabalho não seja destruído... deixo meu pergaminho[10] para ser continuado, caso algum dos membros da raça de Adão possa sobreviver à morte e queira continuar o trabalho por mim iniciado”[11].

Ficou claro que o homem medieval que escreveu as linhas acima não acreditava que alguém pudesse sair vivo de tamanha tragédia. E ele tinha motivos para isso. No final do século XIV a peste matava 200 pessoas por dia em Londres e cerca de 800 em Paris. O dado a seguir é ainda mais impressionante. Houve anos onde os índices de morte superaram os 700% de acréscimo, se comparados aos anos onde as crises epidêmicas não se manifestaram[12].

Sem camponeses, o sistema feudal se enfraquecia. Foram as crises epidêmicas uma das principais causas do fim do feudalismo, sem dúvidas.



[1] professor Pedro Henrique Ramos

[2] prática agrícola que dividia cultivável em partes (duas no sistema bienal, três no sistema trienal), deixando todo ano, alternadamente, uma dessas áreas sem cultivo, para que a terra naturalmente voltasse a ser fértil

[3] in FRANCO JR., Hilário. A Idade Média – O nascimento do Ocidente. – 6ª. ed. – São Paulo: Brasiliense, 1995. p.44

[4] Huberman, Leo. História da riqueza do homem/ Leo Huberman; tradução de Waltensir Dutra. – 21ª. ed. – Rio de Janeiro: Guanabara, 1986. p. 28

[5] Huberman, Leo. História da riqueza do homem/ Leo Huberman; tradução de Waltensir Dutra. – 21ª. ed. – Rio de Janeiro: Guanabara, 1986. p. 29

[6] período onde a doença está se espalhando.

[7] divisão, isolamento, separação

[8] www.dermatologia.net

[9] do verbo perecer, em nosso texto tem o significado de se perder, desaparecer, “morrer”.

[10] uma espécie de folha onde se escreviam documentos, textos, cartas. Poderia ser feito de pele de animal. 

[11] in Huberman, Leo. História da riqueza do homem/ Leo Huberman; tradução de Waltensir Dutra. – 21ª. ed. – Rio de Janeiro: Guanabara, 1986. p. 49

[12] Braudel, Fernand, 1902 - 1985. Civilização material, economia e capitalismo séculos XV - XVIII/ Fernand Braudel; tradução Telma Costa. - São Paulo: Martins Fones, 1995. p. 71