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terça-feira, 6 de junho de 2023

Revoltas camponesas no século XIV

Texto-base – 2ºOIA

Revoltas camponesas no século XIV

Professor Pedro Henrique Maloso Ramos

Nas aulas de História pudemos compreender que o universo medieval era composto por uma situação conflituosa (na verdade, uma série de situações conflituosas): as relações dos senhores feudais e servos.

Ao passo que os servos viviam uma realidade de opressão, escassez e penúria, eram fundamentais para a manutenção dos senhores feudais e, consequentemente, dos feudos. Oras, indiscutivelmente, essa não era uma realidade baseada na tranquilidade e na premissa de coletivismo, por mais que a Igreja buscasse passar essa ideia para os servos. Daí para que situações explosivas rolassem...

Tanto que abordamos esse ponto em um texto nosso. Eis um trecho para relembrarmos, onde analisamos tais problemas sob o prisma dos Renascimentos Comercial e Urbano:

as cidades começaram a colocar em dúvida a figura do feudo e da servidão medieval. Muitos senhores feudais, a princípio, não notaram a influência que os burgos teriam sobre o fim da economia medieval. Só a partir do século XIV isso ficou muito nítido. E daí para a instauração de novas taxas, novos impostos, foi um pulo. Cientes da riqueza dos burgos e buscando manter os seus privilégios, muitos senhores feudais passaram a criar novas obrigações. Alguns reinos, (...), buscando manter o exército e os privilégios da nobreza, aumentaram seus impostos e instituíram outros tantos. Muitas revoltas camponesas começaram a ocorrer. Nessas revoltas, ficava claro que os camponeses já enxergavam a sociedade de uma forma diferente, e as cidades contribuíram muito para isso.[1]  

Por isso, uma das marcas do século XIV foi a das revoltas camponesas, ocorridas especialmente na França e na Inglaterra. E tais revoltas foram violentamente reprimidas pelos senhores feudais, diretamente apoiados pela Igreja Católica.

As crises epidêmicas e as Guerras (seja a dos Cem Anos ou das Duas Rosas, esta no caso inglês) pioraram o que já era muito ruim. Campos em guerra não recebem plantação. Camponeses lutando não produzem. A fome voltou a se alastrar pela Europa Medieval, agora em companhia da mortal Peste Negra.

A situação tornou-se tão grave que passou a ganhar uma designação: as Jacqueries! Logo explicaremos esse termo.

As reivindicações dos camponeses nada tinham de extravagante e, digamos, já eram centenárias: que nem toda (ou quase toda) a produção agrícola fosse pra alimentar a nobreza e pagar as obrigações servis; que os laços de servidão não fossem marcados por uma absurda exploração da força de trabalho campesina. Óbvio que os senhores feudais permaneceram sem ouvir, sem atender.

Ao contrário, leis foram aplicadas e reforçadas para garantir que nenhum servo decidisse ter rompantes de liberdade, sair do feudo e ir viver na cidade, onde “o ar torna o homem livre”. Daí... Revoltas violentas começaram ser corriqueiras. Segue uma pequena lista

- 1358: revolta camponesa na França. É considerada uma das maiores e, de onde, surge o termo Jacquerie.

Ocorrida no norte francês, supostamente teria sido liderada por Jacques Bonhomme, um camponês medieval. Mas há quem afirme que o termo veio do fato dos camponeses usarem uma espécie de jaqueta curta. E jaqueta em inglês é...Jacket. Válido lembrar que durante a Guerra dos Cem Anos, e mesmo antes, os ingleses ocuparam o norte da França. Fato é que o apelido acabou espalhando-se por diversas regiões europeias.  

Como terminou? Com o exército francês massacrando os camponeses entre os dias 9 e 10 de junho de 1358.

- 1381: agora é em solo inglês. E a coisa aqui também foi bem séria. Conhecidas como Revoltas dos Camponeses (Peasants’ Revolt), a narrativa até chegar nelas é muito parecida com o que vimos até agora: efeitos da Peste Negra, das Guerras, das novas taxas e impostos...

Tanto que o gatilho para a explosão dos revoltosos veio quando o oficial real, John Bampton, no dia 30/05/1381, tentou cobrar impostos eleitorais que não foram pagos por parte dos camponeses. Bem, a violência explodiu com uma intensidade brutal. Cartórios e documentos queimados, a exigência de que tais taxas fossem retiradas, o fim dos vínculos de servidão, a deposição de funcionários do rei Ricardo II...

Inspirados pelos sermões do clérigo John Ball (um membro da Igreja com ideias e conceitos vanguardistas e reformadores) e pelo líder campesina Wat Tyler, os revoltosos, em 13 de junho, entraram em Londres e, acompanhados por muitos moradores locais, atacaram as prisões, destruíram o Palácio Savoy, incendiaram livros de leis e edifícios no Templo e mataram qualquer pessoa associada ao governo real.

No dia seguinte, o rei Ricardo II conheceu os rebeldes, e concordou com a maioria de suas exigências, incluindo a abolição da servidão. No mesmo momento alguns camponeses invadiram a Torre de Londres e mataram algumas das mais importantes figuras da monarquia inglesa, dentre as quais Robert Hales, maior responsável pelo Tesouro Real.

Imagem de 1470, presente nas Crônicas de Jean Froissart, do rei Ricardo II conhecendo os revoltosos.

Fato é que de ambas as partes faltava qualquer elemento concreto para garantir que as promessas reais seriam cumpridas. Tanto que, em 15/06/1381, Tyler e diversos revoltosos foram mortos pelas forças reais, e, usando novamente do discurso de que as exigências seriam atendidas, o rei inglês teve tempo de reunir o exército inglês (cerca de quatro mil homens) e liquidar, no final de junho, mais de mil e quinhentos camponeses.

Imagens de camponeses medievais cuidando de ovelhas. Ilustração de Luttrell Psalter (século XIV).  

Mas o que essas revoltas nos mostram? Que a Europa do feudo, da servidão medieval, da lógica senhor feudal – servo estava agonizando. Tinha seu fim claro e evidente. Tanto que os ingleses perceberam que quanto antes acabassem com os vínculos de Suserania e Vassalagem, e fortalecessem a figura de um rei e de um Estado Nacional centralizado, melhor seria para evitar que camponeses voltassem a causar tantos estragos. Afinal, quando uma massa grande de servos se reúne só mesmo o exército para dar conta. E exércitos só poderiam ser efetivamente formados em Estados Nacionais fortes.



[1] https://respirehistoria.blogspot.com/2022/05/13-texto-baixa-idade-media-7-ano.html

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