1º Texto-base: o período pré-colonial (1500 - 1532)[i]
O início das relações entre Portugal e as terras que este
havia “descoberto”, através da expedição de Pedro Álvares Cabral, não
indicava um futuro muito promissor, já que não foram encontrados metais
preciosos em quantidade significativa. Além disso, à primeira vista,
as terras americanas não apresentavam nenhuma especiaria que pudesse
ser efetivamente comercializada, o que gerava o seguinte problema: o
quê fazer com as novas terras? Daí, o pouco interesse em explorar a nova
colônia, terras que, a princípio, interessavam muito menos do que a rota das
especiarias e o comércio oriental. Era necessário encontrar algo
que pudesse ser comercializado, ao contrário do Oriente, onde já existia
um rico mercado de especiarias montado.
O navegador florentino Américo Vespúcio (1454 - 1521),
que navegou tanto para espanhóis quanto para portugueses, e que havia alertado
para a inexistência de algo proveitoso nas terras brasileiras, fez questão de
afirmar a existência de uma grande quantidade de uma árvore específica: o
pau-brasil. Conhecida pelos europeus desde os tempos medievais, a planta era
encontrada nas ilhas do sudeste asiático – a árvore encontrada no Brasil é,
portanto, um “parente” muito próximo da espécie indiana – e com as mesmas
qualidades. Tal árvore é capaz de tingir linhos, sedas e algodões de vermelho.
Tratava-se, portanto, de uma especiaria.
Funcionando dentro da lógica mercantil, a exploração do pau-brasil na
costa brasileira foi feita através do monopólio real. A Coroa arrendou a
exploração do pau-brasil no território brasileiro aos cristãos-novos
(judeus convertidos ao cristianismo), que deveriam pagar uma taxa
anual e levar, no mínimo, seis embarcações por ano para a metrópole, cheias de
pau-brasil.
O primeiro cristão-novo a fechar um contrato com a Coroa portuguesa foi
Fernão de Noronha (1470 - 1540). Isso ocorreu em 1502, sendo que Fernão
arrendou a exploração de pau-brasil por três anos, à frente de um consórcio de
judeus conversos. O acordo foi renovado três vezes, sendo que depois de 1513, a
extração do pau-brasil foi liberada, desde que os exploradores pagassem o
quinto – 20% daquilo que foi explorado – à Coroa portuguesa.
O pau-brasil era extraído de que maneira?
Através de feitorias estabelecidas na costa, os portugueses contavam com
a ajuda do trabalho indígena, por meio do escambo, para extrair as toras de
madeira da mata. Em linhas gerais, o escambo era feito pelas trocas realizadas
entre índios e portugueses. Os primeiros derrubavam e transportavam as toras de
madeira até o litoral em troca de pequenos objetos úteis ofertados pelos
portugueses, como espelhos, pentes, anzóis e facões. Terminada a exploração de
uma dada área, os portugueses abandonavam aquela feitoria e mudavam-se para uma
outra região rica em pau-brasil. Portanto, podemos afirmar que se tratou de uma
atividade apenas exploratória, de caráter rudimentar e nômade, não contribuindo
para a formação de nenhum povoado nas primeiras três décadas de exploração do
pau-brasil. Assim, nenhuma vila surgiu até 1532. Os primeiros portugueses que
ficaram na colônia não podem ser entendidos como colonizadores, na medida em
que estavam em número reduzido e, muitas vezes, viviam com usos e costumes das
populações indígenas - o que, de fato, não era o objetivo da Coroa portuguesa e
muito menos caracterizava um projeto colonizador. No entanto, esses homens
teriam significativa importância quando se iniciou o processo de colonização,
já que conheciam a língua indígena e passariam a atuar como intérpretes. Até
1530 não houve a implantação de nenhum corpo legislativo – regulamentação
documentada - para a nova terra, sendo que os capitães de navios e os líderes
das expedições exerciam as prerrogativas de juízes.
Entre 1500 e 1530, Portugal já enfrentava um grave problema com as
frequentes invasões na nova colônia, principalmente dos franceses. Muitos
desses invasores vinham ao litoral da colônia portuguesa para contrabandear o
pau-brasil. Os franceses possuíam boas relações com algumas tribos indígenas
brasileiras – em especial os tupinambás, que se tornaram seus aliados -, o que
preocupava a Coroa portuguesa, já que isso facilitava o contrabando da madeira.
Visando combater tal problema, a Coroa portuguesa enviou duas expedições guarda
- costeiras ao Brasil, o que de modo algum resolveu a questão das invasões.
No entanto, um problema maior do que esse se colocava para Portugal.
França e Inglaterra não aceitavam a partilha do Novo Mundo entre espanhóis e
portugueses. Os franceses também levantaram uma importante questão, retomando o
conceito de propriedade das terras a partir do Uti Possidetis. Essa clausula colocava que a terra só pertenceria
efetivamente aquele que a ocupasse. O simples envio de expedições
para resguardar a costa de nada valia. A única solução que se apresentou a
Portugal foi a de colonizar a nova terra.
A necessidade de colonizar o Brasil e o temor de perder essas terras
veio com a descoberta pelos espanhóis de jazidas auríferas e de prata na região
do atual México, tornando as terras do Novo Mundo extremamente atrativas. Além
disso, a perda também do monopólio sobre a rota das especiarias orientais,
através do surgimento da concorrência espanhola, fez com que Portugal tivesse
que buscar outro mercado rentável. Assim, com a queda do grande centro
econômico português – o comércio oriental –, a colonização do Brasil se fez
necessária, na medida em que ela poderia auxiliar no renascimento mercantil
lusitano.
Além do mais...
Com a entrada da Espanha na expansão ultramarina – bem como no ciclo das
grandes navegações –, tivemos o início de uma polêmica entre os espanhóis e os
portugueses pela posse das terras recém descobertas da América. Em 1492,
através de Cristóvão Colombo, os espanhóis chegavam ao continente americano. O
próprio Colombo acreditava ter chegado na parte leste do Oriente – o que,
sabemos, é um equívoco –, e a partir das coordenadas cartográficas passadas por
esse, o rei português disse já saber da existência daquelas terras e que,
portanto, seriam de Portugal.
Frente ao imbróglio que se criou, os espanhóis recorreram ao papa,
autoridade maior quando se tratava de assuntos relacionados as terras que não
pertenciam a nenhum reino cristão. A ocasião era extremamente favorável para os
espanhóis, já que o então papa Alexandre VI era espanhol e mantinha estreitas
relações com a coroa espanhola. O resultado da intervenção papal foi
inteiramente favorável aos espanhóis. Em 1493, o papa Alexandre VI publica
a Bula Intercoetera, determinando os domínios portugueses e
espanhóis. Seriam da Espanha as terras que estivessem a oeste da linha
imaginária traçada verticalmente, a 100 léguas a oeste das Ilhas de Cabo Verde.
As terras a leste pertenceriam a Portugal.
Essa divisão do mundo dava aos espanhóis todas as novas terras descobertas.
Como já era previsível, Portugal não aceitou tal partilha e chegou a
ameaçar entrar em conflito com os espanhóis. Estes, percebendo a iminência de
uma guerra, buscaram solucionar o problema, agora sem a interferência do papa,
e sim diretamente com os portugueses. Nesse intuito foi criada uma nova divisão
do mundo, em 1494: o Tratado de Tordesilhas. Dessa vez o meridiano passava a
370 léguas à oeste das ilhas de Cabo Verde. As terras a leste do meridiano
pertenceriam a Portugal, e as terras a oeste pertenceriam aos espanhóis.
Com esse novo Tratado, a rota para as Índias estava assegurada para
Portugal, ou seja, o continente africano. Além disso, estava garantida a posse
de uma parte das terras descobertas. No Brasil, a linha do Tratado se estendia
do que hoje são as cidades de Belém (PA) até Laguna (SC).
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