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sexta-feira, 30 de janeiro de 2015

Olhares sobre o Brasil do século XIX – Como as pessoas viviam? – 3ª Parte

 Olhares sobre o Brasil do século XIX – Como as pessoas viviam? – 3ª Parte[1]
Historia da Habitação no Brasil 1822 – 1850[2]
Até o início do século XIX podemos definir que o Brasil vivia sob a seguinte definição: uma sociedade marcadamente rural, com pouca ou irrisória vida urbana. É como se toda a população vivesse nas áreas rurais, o que de fato chegava a ocorrer. Mais de 90% da riqueza produzida em nosso país, recém-independente de Portugal, vinha das fazendas e dos núcleos rurais espalhados pelo seu extenso território. Assim, não é errado definir o universo brasileiro do período como uma sociedade marcada pela “riqueza rural e a miséria urbana”.
Grande parte da população brasileira no século XIX era formada por homens pobres e escravos que viviam nas áreas rurais. Na imagem, "Habitação de negros", obra de Johann Moritz Rugendas (1802 - 1858)[3].
Mas, como você pôde perceber, 1808 começou a trazer uma mudança de realidade para a nossa sociedade. A chegada da família real portuguesa e toda a sua comitiva começou a alterar de maneira significativa a realidade da sociedade brasileira.
Entre 1822 e 1850 as mudanças ocorreram, porém não foram de grande importância, se compararmos com o período anterior (1808 - 1822). Na verdade, a maior e mais importante alteração ocorrida foi à vinda aos poucos dos escravos negros para o espaço urbano, fazendo com que alguns desses saíssem das fazendas e passassem a viver nas cidades.
A vinda desses escravos para as cidades veio acompanhada da necessidade cada vez maior dos habitantes urbanos em terem trabalhadores para os chamados serviços públicos, bem como para serviços privados. Logo, logo você irá entender uma afirmação que faremos agora: a cidade, o espaço urbano veio acentuar as desigualdades sociais entre negros e brancos, acentuar o fosso que separava negros e brancos em nossa sociedade. Mas também trouxe de maneira bastante intensa as discussões acerca dos movimentos abolicionistas para o Brasil.
Cidade do Rio de Janeiro, em 1834. Pintura feita por Jean-Baptiste Debret (1768 – 1848) [4].
Como seria uma cidade brasileira na primeira metade do século XIX?
Imagine-se um brasileiro vivendo em uma cidade brasileira. Acredite, isso é bem difícil, bem difícil mesmo. Só para você ter uma ideia ninguém, absolutamente ninguém tinha exata ideia de quantos brasileiros existiam no Brasil em 1822. Nem em 1840, nem 1850... Aliás, foi só em 1872 que se realizou o primeiro censo em nosso país. Antes disso, o que se tem são suposições, baseadas em alguns poucos e imprecisos registros.
Dê uma olhada na tabela abaixo. Perceba que os dados de 1872 são bem mais precisos[5].
Ano
Brancos livres
Mulatos livres
Índios livres
Total livres
Escravos negros
Total
1818
1.043.000 – 27,3%
585.500 – 15,3%
259.400 – 6.9%
1.887.900 – 49,5%
1.930.000 – 47,9%
3.817.900 – 100%
1850
2.436.000 – 31%
2.732.000 – 34%
302.000 – 3,8%
5.520.000 – 68,8%
2.500.000 – 31,2%
8.020.000 – 100%
1872
3.787.289 – 38,1 %
4.245.428 – 42,8%
386.955 – 3,9%
8.419.672 – 84,8%
1.510.806 – 15,2%
9.930.478 - 100%
O que foi revelado, através do censo 1872, era um país essencialmente rural, formado por quase dez milhões de habitantes, o que hoje seria a população da cidade de São Paulo. Nesse período a maioria da população era formada por homens (aproximadamente 52%), sendo que os estados mais populosos eram (em ordem decrescente) Minas Gerais (de cada cinco brasileiros um era mineiro), Bahia, Pernambuco, e só depois Rio de Janeiro e São Paulo (hoje o estado mais populoso).
Então, muito provavelmente você seria um mineiro, vivendo em uma área rural. Agora, caso fosse um habitante das cidades, provavelmente viveria em alguma das cidades mineiras erguidas no período pomposo da mineração em nosso país, lá no século XVIII. Aliás, essas eram as únicas cidades do início do século, excetuando talvez Salvador (Bahia) e Rio de Janeiro (Rio de Janeiro) com vida social urbana considerável. As outras, como é o caso de São Paulo, se quer poderiam ser entendidas como cidades, já que na verdade eram áreas rurais, vilarejos cercados por densa mata e inúmeras áreas inóspitas (ou seja, que ainda não haviam sido exploradas pelo governo).
Ouro Preto era uma das poucas cidades brasileiras do período. Em Ouro Preto foi fundada o que seria a primeira escola de Farmácia da América do Sul, 1839.
Imagem da cidade em 1870[6]

As cenas que talvez você mais presenciasse ao redor das cidades seriam a de homens com machados derrubando árvores, principalmente entre as regiões do Rio de Janeiro e Minas Gerais, seja para construção de estradas (não vá pensando em estradas asfaltadas... Era chão de terra batida mesmo), seja para iniciar o plantio do café.
Aliás, leia que registro mais interessante sobre esse momento:
“O trabalho foi duro. Os machados cantaram de sol a sol nos troncos das perobeiras[7]; o escurecer, ouvia-se o grito de alerta e, logo depois, a árvore pendia para o lado, desabava com estrondo, alarmando o silêncio da floresta. Centenas e centenas de troncudos jacarandás[8] tiveram o mesmo fim. Para trás, em pé, só ficou um pau-d’alho[9], como padrão de terra boa. (...) Era ali, naquela copa diluída no céu, que pousavam maitacas e tiribas[10], em bandos tão espessos que toldavam[11] a limpidez das tardes. Ao escurecer, o sabiá-coleira cantava a tristeza do sertão”[12]
Essa gravura, feita por Rugendas, mostra o que o relato acima nos contou[13].

Voltando à nossa experiência, muito provavelmente, caso você fosse um homem livre, estaria trabalhando em alguma das fazendas da região, indo muito esporadicamente para as cidades. Nas cidades havia pouquíssimo emprego, e toda a economia girava entorno das fazendas de café. Aliás, havia fazendas que reuniam muito mais moradores do que cidades inteiras do Brasil nesse período. Algumas fazendas tinham mais de mil pessoas vivendo nelas.
Essas primeiras fazendas foram instaladas na região entre Minas Gerais e São Paulo, sendo iniciadas por comerciantes, tropeiros ou mineradores, que dispondo de dinheiro investiam na formação dos cafezais. A região do Vale do Paraíba, antes coberta pela exuberante Mata Atlântica, dava vez às fazendas de café.
As “cidades-fazenda” eram realmente o mundo dos brasileiros nesse período. Leia esse trecho que retrata como eram as fazendas de café.
“No centro da propriedade ficava o terreiro, um grande quadrado pavimentado, em torno do qual se distribuíam as demais construções, de acordo com a importância e a necessidade.
A casa-grande, em posição de maior destaque em relação às demais construções, era um sobrado construído de taipa de pilão, com divisórias de pau a pique (abaixo você verá imagens de construções desse tipo). Tinha numerosas janelas, sala de jantar com imensas mesas de jacarandá[14], quartos de todos os feitios, alguns até escuros, sem janelas, as chamadas alcovas[15]. A cozinha, muito grande e com chão de terra batida, possuía no centro um fogão de lenha. Não havia banheiros; os seus moradores usavam bacias para o banho, e urinóis[16].
Ao lado da casa havia a capela, frequentada pelos senhores e pelos escravos; havia também o pomar, o jardim, a horta e os locais destinados à criação de animais domésticos; ainda em torno do terreiro ficavam as construções ligadas ao trabalho: a senzala (casa dos escravos), a casa do administrador, a marcenaria, a carpintaria e a ferraria. Esse conjunto de casarões austeros e muralhas ao redor de um quadrado desnudo e pavimentado tinha um aspecto triste, lembrando mais uma fortificação que um estabelecimento agrícola. Daí, a denominação de fortaleza dada a muitas fazendas” [17].
Uma fazenda de café do século XIX. Óleo de Johann Georg Grimm (1846 – 1887)[18].
Na verdade, as cidades tinham uma função muito específica, bem específica mesmo. Elas eram as centrais políticas do país, onde os grandes barões do café, os homens mais poderosos da nação se reuniam para debater as suas ideias. A casa do barão do café na cidade funcionava como escritório político. Às vezes, o barão ia até a sua casa na cidade, discutia os assuntos, e tão logo tivesse terminado as discussões, voltava para a fazenda.
Essas casas do século XIX eram diferentes das que foram construídas até então no Brasil. Elas tinham um estilo que tentava copiar o estilo das casas inglesas, com grandes colunas e janelas. Assim, buscava-se dar a ideia de que eram cidades europeias em pleno solo americano. 
Portanto, você pôde notar que a vida no espaço urbano era bem diferente do que temos nos dias de hoje. Mas fica a pergunta: e a população pobre do Brasil? Havia pobres morando nas cidades?
Bem, no período de 1822 a 1850 eram raros os moradores urbanos, como vimos. E os que moravam nas cidades viviam em condições muito parecidas com os moradores das áreas rurais, já que praticamente não havia grande diferença entre esses dois mundos. Parte significativa dos moradores das cidades era formada por escravos negros. Realizavam trabalhos domésticos, desde o preparo da comida das famílias dos barões do café, a locomoção destes, carregando-os em cadeirinhas, cuidando de esvaziar os urinóis, carregando para fora das casas as urinas e fezes dos seus senhores, até no trato dos filhos das senhoras brancas.
A presença de escravos negros nas cidades brasileiras começou a se tornar cada vez mais comum no século XIX. Com a chegada da família real portuguesa em 1808 e o início de um processo de modernização do espaço urbano no Brasil, ficou clara a necessidade dos trabalhadores nesses espaços. E o escravo negro era a mão de obra ainda muito utilizada no período.  Não à toa, em 1835, na cidade de Salvador, ocorreu uma das maiores revoltas escravas do século XIX no Brasil: a Revolta dos Malês.
Malê era forma como era conhecido no Brasil o escravo africano muçulmano. A revolta ocorreu entre 24 e 25 de janeiro de 1835, levando a participação de centenas de escravos. Rapidamente a elite branca tratou de eliminar o movimento, matando cerca de setenta, e condenando mais de quinhentos, com penas que iam desde a deportação, até a execução.
Um dos motivos para a ocorrência da revolta no espaço urbano foi o fato de que havia uma insatisfação crescente das populações mais pobres que habitavam as cidades. Sejam escravos negros, índios, ou mesmo homens livres pobres, as cidades aumentavam as desigualdades sociais. As áreas mais insalubres, sem as mínimas condições de higiene, recebiam os moradores mais pobres do Brasil. E tinha início o surgimento dos cortiços, construções rudimentares, agregando um enorme número de pessoas, muitas das quais negros alforriados, mulatos e índios livres. Os cortiços se proliferaram de maneira impressionante pelas cidades brasileiras no século XIX. Poderiam ser comparados com as favelas brasileiras.
Cortiço brasileiro no início do século XX. 

Assim, a maioria dos moradores dos espaços urbanos vivia em condições de miséria, vivendo em função do que era produzido no campo, nas lavouras de café. As cidades funcionavam como hospedarias, abrigando tropeiros que carregavam sacas e mais sacas de café nos lombos de mulas e burros até chegar aos portos onde a mercadoria seria levada para a Europa.




[2] RAMOS, Pedro Henrique Maloso
[3] Imagem retirada do sítio http://www.camaracampos.rj.gov.br/tp-cultura/exposicao-escravidao-no-brasil/
[4] Imagem retirada do sítio http://commons.wikimedia.org/wiki/File:RealTeatroSJoao-Debret-1834.jpg
[5] MALHEIRO, Perdigão. Escravidão no Brasil. In Quevedo, Júlio. A escravidão no Brasil: trabalho e resistência/ Júlio Quevedo, Marlene Ordõnez. – São Paulo: FTD, 1996. – (Para conhecer melhor). p. 38.
[6] Imagem retirada do sítio http://pt.wikipedia.org/wiki/Ouro_Preto
[7] Designação comum a várias espécies de árvores. Tais árvores tiveram suas madeiras utilizadas na construção de móveis e suportes para as casas.
[8] Outra espécie de árvore que, assim como as perobas, era de grande porte.
[9] Mais uma espécie de árvore. Sua ocorrência era tida como indício de que a terra era fértil.
[10] Tanto maitacas quanto tiribas são espécies de psitacídeos, pássaros da família dos papagaios e araras 
[11] Cobriam. Ou seja, eram tantas que cobriam os céus.
[12] Afonso Schimidt, A Marcha in Toledo, Vera Vilhena de. Sua Majestade o café/ Vera Vilhena de Toledo, Cândida Beatriz Vilares Gancho. – São Paulo: Moderna, 1992 – (Coleção Desafios); p. 23.
[13] Imagem extraída do sítio http://www.osaqua.com.br/2014/05/06/tenente-coronel-da-guarda-nacional-o-barao-de-saquarema-foi-o-inventor-do-municipio/
[14] Espécie de árvore.
[15] Quarto de dormir... Mais está mais para quarto dos pesadelos!
[16] Nos urinóis, que muitas vezes eram baldes de madeira, eram feitas as necessidades fisiológicas.
[17] Toledo, Vera Vilhena de. Sua Majestade o café/ Vera Vilhena de Toledo, Cândida Beatriz Vilares Gancho. – São Paulo: Moderna, 1992 – (Coleção Desafios); p. 28.
[18] Imagem extraída do sítio http://www.turismovaledocafe.com/2011/10/johann-georg-grimm-e-as-fazendas-de.html

Olhares sobre o Brasil do século XIX – Como as pessoas viviam? – 2ª Parte

Olhares sobre o Brasil do século XIX – Como as pessoas viviam? – 2ª Parte[1]
Transporte e comunicação[2]
Nesse exato momento em que você está lendo esse texto, se for do seu interesse, você poderá visitar ruas de Paris, “caminhar” pelas vielas de uma cidade italiana. Tudo isso através do computador, a partir de imagens atualizadas com uma velocidade impressionante. E se quiser visitar lugares muito distantes é óbvio que você não pensará duas vezes: pegará um voo e dentro de algumas horas você poderá estar a milhares de quilômetros da sua casa.
Mas e no século XIX? Como as pessoas faziam para andar, visitar lugares diferentes e se comunicar? Olha, você vai se surpreender.
Só para você ter uma ideia, no final do século XIX as pessoas levavam mais de 28 dias para atravessar da Itália para a América a bordo dos navios, hoje uma viagem que é feita de avião, em no máximo 14 horas.  Naquela época, só de navio mesmo. E em situações para lá de complicadas. Era comum que pessoas morressem contaminadas com a comida que se estragava nos porões das embarcações, uma vez que a geladeira só se tornou um objeto mais popular (traduzindo: mais barato) no final da década de 1930.
Então, imagine como era no início do século XIX. Em seu livro “Domitila de Castro – Marquesa de Santos”, o escritor Tavares Pinhão relata como teria ocorrido a viagem da marquesa entre o Rio de Janeiro e São Paulo. Dê uma lida no relato:
“debaixo de um sol a pino, trotando pela estrada poeirenta de São Paulo, a senhora Marquesa de Santos deixava irremediavelmente a Corte (...)” [3].
Como assim... Trotando? Estrada poeirenta? Não, você não leu errado. A viagem, ocorrida na primeira metade do século XIX relata qual era o principal meio de transporte (considerado o top, tipo voo executivo, só para ricaços, tipo baronesas, príncipes, marquesas): charretes. Para os mais pobres era comum caminhar a pé mesmo, ou quando muito em carros de boi. Isso ajuda a explicar o resultado de estudos que mostram que até parte significativa do século XIX os vínculos das pessoas envolviam grupos que estavam em um raio de cinco quilômetros quadrados (1/3 do tamanho do município de São Caetano do Sul, considerado um dos menores municípios do Brasil). Hoje quantos amigos você possui que moram a milhares de quilômetros de você? Quantos parentes? É, a coisa mudou mesmo.
Não há dado claros de quanto tempo demorava a viagem do Rio até São Paulo no lombo e mulas, cavalos ou mesmo dentro de charretes. Mas a média de quilômetros percorridos por dia não chegava aos cinquenta. Logo, os mais de trezentos e cinquenta quilômetros que dividem as duas cidades seriam percorridos no mínimo em oito, nove dias. Duas semanas e não se fala mais nisso.
Hoje, só a título de comparação, uma viagem de avião leva no máximo uma hora. De carro, cerca de cinco, seis horas.
Em 1883, o jornalista Carl von Koseritz, um alemão que passou a morar no Brasil, narrou uma viagem de trem entre o Rio de Janeiro e São Paulo. O relato é fantástico, e pode ser lido na íntegra no endereço que segue na nota de rodapé[4]. Vale realmente a pena ser lido. Koseritz conta do encantamento com a viagem, os túneis, a serra, toda aquela modernidade. E daí solta a seguinte informação:
“São 9 horas e um quarto e nós cobrimos 154 quilômetros em 4 horas e meia.”
Ou seja, o trem andava a uma velocidade média de 34 km/h! O Usain Bolt corre a uma velocidade superior quando disputa a prova dos cem metros.

O meio de transporte de muitos e muitos brasileiros até a primeira metade do século XX.
Uma das estações por onde Koseritz passou durante a sua viagem do Rio para São Paulo[5].

Agora, comunicar-se com as pessoas durante a maior parte do século XIX só através de cartas. O correio surgiu oficialmente no Brasil em 1663, e os “carteiros” eram os escravos e os tropeiros, homens responsáveis pela compra e venda de gado, que ficavam indo de uma cidade a outra para levar o rebanho, negociar bezerros, vaquinhas...
Assim, não foram raros os casos das notícias chegarem aos lugares depois do fato já ter ocorrido há muito, muito tempo. Era enviada uma carta dizendo de uma guerra. E quando ele havia chegado ao destinatário a guerra já havia acabado. Isso foi mais comum do que você possa imaginar.
O primeiro aparelho de telefone foi instalado no Brasil em 1877, na residência de dom Pedro II. E para ligar rolava todo um esquema, nada de ficar teclando os números. Uma telefonista é quem discava, fazia a chamada. Só em 1966, há pouco tempo, a coisa mudou.
 Um dos primeiros telefones usados no Brasil[6].




[1] Para a leitura do primeiro texto dessa série acesse http://respirehistoria.blogspot.com.br/2015/01/olhares-sobre-o-brasil-do-seculo-xix.html
[2] Ramos, Pedro Henrique Maloso
[3] PINHÃO, Tavares. Domitila de Castro – Marquesa de Santos. São Paulo: Anchieta, 1942. p. 18
[4] http://www.anpf.com.br/
[5] Imagem extraída do sítio http://www.estacoesferroviarias.com.br/efcb_rj_linha_centro/japeri.htm
[6] Imagem extraída do sítio http://www.telesystemsul.com.br/o-telefone-chega-ao-brasil/

Arquimedes de Siracusa – 2ª Parte

Arquimedes de Siracusa – 2ª Parte[1]
Nesse segundo texto, (para ler o primeiro acesse: http://respirehistoria.blogspot.com.br/2015/01/arquimedes-de-siracusa-1-parte.html) sobre o genial Arquimedes, vamos tratar de outras invenções e descobertas do pensador grego, bem como conhecer a civilização onde Arquimedes viveu.
Apesar de nascer em Siracusa, a vida de Arquimedes, pelo menos durante o seu período de formação acadêmica, ocorreu em Alexandria, na região do delta do rio Nilo. Foi lá que o grego se dedicou à matemática, em especial a geometria. Seu brilhantismo logo apareceu, com a publicação de diversos trabalhos científicos.
A Grécia, onde viveu Arquimedes, era uma civilização que já havia passado por uma série de mudanças, a maioria fruto das batalhas entre as cidades-Estado gregas, ou entre os gregos e povos invasores. Sendo assim, Arquimedes viveu o que é definido pelos historiadores como o último período da Grécia Antiga, o período Helenístico (séculos IV – II a.C.). O período ficou conhecido pela decadência das poleis e o domínio da Macedônia e, posteriormente, de Roma sobre os gregos.
O período Helenístico
No período, a influência macedônica sobre a Grécia Antiga foi enorme. A Macedônia era uma região ao norte da Grécia Antiga e, até o século IV a.C., esteve isolada comercialmente, baseando suas atividades na pecuária e na agricultura.
Porém foi com o rei macedônico Filipe II que a situação mudou. Em 359 a.C. Filipe II iniciou a expansão macedônica em direção à Grécia, e, após alguns conflitos, o rei macedônico conquistou a região (incluindo as cidades-Estado de Atenas, Esparta e Tebas). Com a conquista de toda a área grega, Filipe organizou as cidades-Estado sob sua direção, através da Liga de Corinto, buscando com isso impedir o avanço persa sobre a região.
Filipe II foi assassinado em 336 a.C. e em seu lugar assumiu Alexandre, o Grande, seu filho. Alexandre praticou uma política de expansão, o que fez com que derrotasse os persas, partindo para a conquista de várias regiões, entre elas o Egito e a Fenícia. É válido lembrar que Alexandria fica no Egito, sendo fundada por Alexandre, o Grande. Daí, a origem do nome. Alexandre formou, em pouco tempo, um gigantesco império e promoveu alianças com a nobreza persa, buscando adotar algumas técnicas e elementos culturais das civilizações que estabelecia contato ou dominava. Estabeleceu uma forte monarquia baseada no direito divino, baseando-se na ideia de que o imperador havia sido escolhido por Deus, e que, portanto, era insubstituível.
Na cidade de Alexandria existia uma fabuloso conjunto arquitetônico, formado por um grandioso farol, pela maior biblioteca do mundo antigo, a biblioteca de Alexandria, e pelas catacumbas de Kom el Shoqafa. A cidade foi a capital do Egito. Imagem recriando o que seria o farol de Alexandria. A biblioteca se situaria na base do farol[2].  

 Com a morte de Alexandre, em 323 a.C., o império macedônico passou por disputas internas (vários generais queriam assumir o controle) o que fez com que a Macedônia se enfraquecesse e caísse sob domínio romano. A vida de Arquimedes esteve diretamente associada aos seguintes acontecimentos: a chegada dos romanos e a consequentemente dominação de alguns dos territórios, que outrora pertenciam aos macedônicos.
Arquimedes, suas invenções e a invasão romana
Ao retornar para Alexandria, Arquimedes já era conhecido pela sua capacidade em solucionar problemas e pelo cabedal de descobertas que havia feito. Sendo assim, o retorno à cidade natal foi marcado por estudos nas áreas da Geometria e da Mecânica, passando a fazer descobertas impressionantes.
Outro “causo”, dessa vez contado por Plutarco (45 – 120), historiador, biógrafo e ensaísta romano, foi de que Arquimedes assegurou à Hierão II, o mesmo rei que havia pedido para Arquimedes solucionar o problema com a coroa, que, se lhe fosse dado um apoio, conseguiria mover objetos extremamente pesados. O rei, convencido da capacidade de Arquimedes, o incentivou a demonstrar a sua ideia. Através de um complexo sistema de roldanas, o pensador grego conseguiu levantar um navio com três mastros, sendo que o mesmo estava totalmente carregado.
Agora, se você acha que as invenções de Arquimedes se limitaram somente a isso, ledo engano. “Dos seus trabalhos matemáticos destaca-se a medida do círculo, no qual considerou a medida  de pi = 3 e 1/7  que obteve através da circunscrição e inscrição de um círculo com polígonos regulares de 96 lados. 
Provou vários resultados geométricos entre os quais que o volume da esfera é dois terços do volume do cilindro circunscrito (Ve = 2/3 Vc). Considerou esta como a sua mais importante realização pelo que mandou gravar no seu túmulo a representação de um cilindro circunscrevendo uma esfera.

Desenvolveu a mecânica, tendo inventado máquinas para a defesa de Siracusa como por exemplo os sistemas de roldanas, a catapulta (com base na alavanca) e o espelho de queimar (espelhos parabólicos de bronze que concentravam os raios solares)”[3].
E foram justamente essas invenções militares que permitiram que a cidade natal de Arquimedes lutasse contra os invasores romanos. Foram três anos de resistência ao domínio romano, algo conseguido graças aos inventos do genial Arquimedes. No entanto, o general e cônsul da república romana, Marco Cláudio Marcelo (268 – 208 a.C.) logrou êxito, conquistando Siracusa entre 214 e 212 a.C.
A morte de Arquimedes ocorreu em 212, estando diretamente envolvida com a invasão romana à Siracusa. E, para variar, existem diversas versões sobre o que teria ocorrido. Há quem narre o fato de que um soldado romano havia interpelado Arquimedes para que o mesmo se levantasse, mas entretido em um problema matemático, Arquimedes o ignorou. Acabou sendo morto. Plutarco narrou a morte de Arquimedes. Fiquemos com sua descrição.
Representação do momento que antecedeu a morte de Arquimedes[4]

"Tomadas também estas, na mesma manhã marchou Marcelo para os Hexápilos[5], dando-lhe parabéns todos os chefes que estavam às suas ordens; mas dele mesmo se diz que ao ver e registrar do alto a grandeza e beleza de semelhante cidade, derramou muitas lágrimas, compadecendo-se do que iria acontecer... os soldados que haviam pedido se lhes concedesse o direito ao saque... e que fosse incendiada e destruída. Em nada disso consentiu Marcelo e, só por força e com repugnância, condescendeu em que se aproveitassem dos bens e dos escravos... mandando expressamente que não se desse morte, nem se fizesse violência, nem se escravizasse nenhum dos siracusanos... Mas, o que principalmente afligiu a Marcelo foi o que ocorreu com Arquimedes: encontrava-se este, casualmente, entregue ao exame de certa figura matemática e, fixo nela seu espírito e sua vista, não percebeu a invasão dos romanos, nem a conquista da cidade. Apresentou-se-lhe repentinamente um soldado, dando-lhe ordem de que o acompanhasse à casa de Marcelo; ele, porém, não quis ir antes de resolver o problema e chegar até a demonstração; com o que, irritado, o soldado desembainhou a espada e matou-o... Marcelo o sentiu muito e ordenou ao soldado assassino que se retirasse de sua presença como abominável, e mandando buscar os parentes do sábio, tratou-os com o maior apreço e distinção"[6].
As obras de Arquimedes
Pouco do que Arquimedes escreveu e postulou foi efetivamente preservado. Tanto que muito do que se tem de informação sobre os escritos do pensador está presente em obras de outros pensadores gregos, que não raras vezes, o citam.
Escritas em grego dórico, o dialeto de Siracusa, as obras revelam um investigador contumaz. “Durante sua vida, Arquimedes tornou seu trabalho conhecido através de correspondências mantidas com matemáticos de Alexandria. Os escritos de Arquimedes foram coletados pelo arquiteto bizantino  Isidoro de Mileto (c. 530 d.C.), ao passo que, comentários escritos no século VI d.C., por Eutócio, a respeito dos trabalhos de Arquimedes, ajudaram a difundir seu trabalho a um público mais amplo. O trabalho de Arquimedes foi traduzido para o árabe por Thãbit ibn Qurra (836 –901 d.C.), e para o latim, por Gerardo de Cremona (c. 1114–1187 d.C.). Durante o  Renascimento, em 1544, o Editio Princeps (Primeira Edição) foi publicado na Basileia,  por Johann Herwagen, com as obras de Arquimedes em grego e latim. Por volta do ano 1586, Galileu Galilei inventou uma balança hidrostática para a pesagem de metais no ar e na água, aparentemente inspirado no trabalho de Arquimedes”[7].
“Dê-me um ponto de apoio, e moverei o mundo” [8].





[1] RAMOS, Pedro Henrique Maloso
[2] Imagem extraída do sítio http://pt.wikipedia.org/wiki/Alexandria#mediaviewer/File:PHAROS2006.jpg
[3] http://netbiografias.blogspot.com.br/2013/01/arquimedes.html
[4] Imagem extraída do sítio http://www.if.ufrgs.br/tex/fis01043/20012/Severo/arquimedes.html
[5] De Hexápole dórica, se tratava da federação de cidades-Estado gregas no sudoeste da Ásia Menor, fundada pelas colônias dóricas. Os dórios foram um dos povos formadores da Grécia Antiga.
[6] http://www.somatematica.com.br/biograf/arquimedes.php
[8]Imagem extraída do sítio http://pt.wikipedia.org/wiki/Arquimedes#mediaviewer/File:Archimedes_lever_(Small).jpg